Um convite, uma missão, uma luta. Uma delegação do povo
Kanela deixa a tranquilidade da grande aldeia de Porquinhos, com mais de 800
habitantes, rumo a Brasília. Não vieram dizer apenas que existem, mostrando
seus rostos cansados, mas sorridentes e confiantes, de um povo guerreiro, do
tronco linguístico macro-jê, da nação Timbira. Vieram exigir direitos, falando
ao coração de ministros, senadores e deputados.
Apesar de um século e meio de contato com a sociedade,
envolvente, invasora, vivem conforme sua cultura e costumes. Mal conseguem se expressar
em português. As mulheres praticamente só se comunicam em sua própria língua.
Terra é nossa luta
Vieram tratar de uma questão muito especial e preocupante: a
demarcação e garantia de seu território. No dia 30 de setembro do ano passado,
a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal anulou a portaria 3.058 de 21/10/2009 do
Ministério da Justiça. Definidos os limites da terra, foi iniciado o processo
de demarcação física, conforme previsto no Decreto 1775/96. Porém, o trabalho
foi paralisado por pressão dos interesses políticos e econômicos da região. A comunidade
indígena ficou então em total insegurança, sem saber ao certo porque os
organismos dos “Kupen” (não índios) estavam impedindo a demarcação de seu
território tradicional. Decidiram então vir a Brasília para saber ao certo do
que se tratava e conversar diretamente ao coração dos responsáveis, falando da
necessidade da demarcação daquelas terras e narrando a história de massacres,
invasões e violências a que os “Mehin” (indígenas) foram submetidos nessas
últimas décadas.
“Não viemos com arco e flecha brigar pelos nossos direitos.
Viemos armados com a memória do nosso sofrimento para levar ao coração dos
ministros que decidem sobre nossas terras e nossas vidas. Queremos mostrar a
eles nossos rostos de mulheres, crianças, anciãos e guerreiros. Pedimos a eles
que façam justiça, reconheçam nossas terras, que precisamos para viver em paz,
com alegria e a sabedoria do nosso povo”.
Dessa forma, Elias Apanyekra externou o desejo de sua gente, que não
quer ser destruída.
Visitas, falas e
apoios
Os Apanyekra tiveram um dia diferente do que quando estão na
mata, no roçado ou no rio, na aldeia. Enfrentaram as longas caminhadas dos
corredores no emaranhado de gabinetes de parlamentares e ministros. Em quase
todos os lugares foram recebidos com simpatia e com a promessa de apoio a seus
direitos. Foram econômicos nas palavras, mas eficazes o suficiente para dar o
seu recado. A simples presença nos corredores e gabinetes com seu jeito Timbira
de ser propiciou várias manifestações de solidariedade e reconhecimento. “Esses
são os primeiros brasileiros”. “É muito importante vocês estarem aqui”. “Contem
com o nosso apoio às reivindicações”. “Tragam o registro de todos esses
massacres do vosso povo para podermos ajudar melhor”.
Vários parlamentares pediram para tirar fotos para colocar
no facebook. O deputado Tiririca, com seus cabelos brancos e jeito brincalhão,
chamou a atenção no corredor do quinto andar do anexo IV.
Hoje estarão visitando senadores e mostrando seus rostos aos
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), marcando presença no plenário,
mostrando que existem e que são atingidos por suas decisões.
“Viemos falar do nosso sofrimento. Fomos massacrados,
invadidos e agora vemos com muita dor as nossas terras tradicionais sendo
ocupadas pelos fazendeiros, com plantação de eucalipto e soja. Os caçadores
entram em nossas terras e estão acabando com os animais. Mas quando vão
demarcar nossa terra, vamos fazer festa. Os macacos bugios vão ficar alegres,
podem também viver em paz”. Dessa forma, Manoel Apaneykrá externou sua
confiança de verem suas terras demarcadas e livres de invasões.
Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 20 de agosto de 2015.
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