As oligarquias coloniais e atuais, o
latifúndio e mais recentemente o agronegócio nunca admitiram que os povos
indígenas fossem sujeitos de direitos coletivos, principalmente de seus
territórios. Pelo contrário, combateram sistematicamente esses direitos, com
armas e leis. Para muitos, “índio bom é índio morto”. Mobilizaram o Estado e as
milícias privadas, os jagunços e os bugreiros, no intuito de exterminar física
e culturalmente, a maior parte dos quase mil povos indígenas que viviam no
atual território brasileiro. Agem orquestrada e sorrateiramente como revelam as
investigações do MPF em que denunciam a participação de advogado da CNA na elaboração
do relatório da PEC 215.
A recente CPI criada na Assembleia Legislativa do Mato
Grosso do Sul é a mais cabal demonstração dessa política secular. Para impedir
que os direitos constitucionais indígenas sejam cumpridos, urdem tramoias com o
único intuito de desviar a atenção dos crimes e violência praticada contra os povos
nativos e dessa forma impedirem a demarcação e respeito aos territórios
indígenas. Agem com truculência, à revelia da lei, muitas vezes, na certeza da
impunidade. Não satisfeitos, viram suas baterias contra os aliados desses
povos, como é o caso da recente CPI do Cimi.
Essa é uma prática histórica desses setores anti-indígenas.
Na ditadura militar o genocídio tinha o nome de “emancipação”, ou seja, um
etnocídio oficial patrocinado pelo grande capital. Por ocasião da Constituinte,
em 1987, mais duas tentativas com o mesmo intuito. Em agosto daquele ano
desfecharam uma violenta campanha de difamação contra o Cimi. Conseguiram
montar uma CPMI – Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, a partir de
documentos comprovadamente falsos. O golpe contra os direitos indígenas foi
amplamente divulgado na grande
imprensa nacional, numa das mais sórdidas e brutais campanhas movidas contra
uma entidade na história recente desse país. Não tardou e o verdadeiro objetivo
veio à tona, com a proposta genocida, do substitutivo vergonhoso do relator da Constituição,
deputado Bernardo Cabral. Felizmente os povos indígenas conseguiram reverter a
situação e foi aprovado o capítulo com os direitos indígenas. Porém, os setores
anti-indígenas não desistiram, nesses 28 anos, de tentar suprimir os direitos
indígenas da Constituição. Desde 1990 tentaram inúmeras vezes e de diversas
formas rasgar, na lei e na prática esses direitos. Em 1993, ano que eram para
estar demarcadas todas as terras indígenas, esses mesmos setores propuseram uma
revisão constitucional em que pretendia simplesmente acabar com os direitos
indígenas e outras conquistas sociais. Malograram no seu perverso intento. Nos
últimos anos recrudescem sua ofensiva anti-indígena com uma centena de
iniciativas legislativas, executivas e judiciais. Esse é o contexto em que se
instaura a CPI contra os direitos indígenas, na Assembleia Legislativa do Mato
Grosso do Sul.
A luta e a
solidariedade
Nesta semana os povos indígenas do estado de Tocantins e de
outros estados, realizaram importantes debates e contatos visando dar
visibilidade às violências e desrespeito a seus direitos. Além de reafirmarem
sua inabalável decisão de não permitir retrocesso nos direitos constitucionais conquistados,
avançaram na perspectiva de consolidar alianças e lutas, principalmente com
outros setores sociais, particularmente as populações tradicionais e todos os
que lutam no campo por terra e justiça.
Um dos pontos mais destacados foi a definição de estratégias
de apoio a demarcação da terra dos Avá-Canoeiro e aos Kaiowá Guarani do Mato
Grosso do Sul, na luta por seus territórios e vida digna.
Em audiência pública na Assembleia Legislativa os
parlamentares presentes se comprometeram em criar um grupo para fazer a visita
a todas as terras indígenas a fim de averiguar e sentir a agressão e violência
do agronegócio que está se expandindo com rastros de veneno e destruição,
atingindo a maioria das terras indígenas. Também assumiram a criação de uma CPI
sobre o descaso com a saúde indígena por parte dos governos federal e estadual.
Jogos Mundiais
Indígenas: “nossa participação será nas ruas”
Na
mesa sobre os Jogos Mundiais Indígenas participou o coordenador da Comissão
Especial dos Jogos, sr. Ector Blanco que foi duramente questionado e cobrado.
Ele destacou o caráter celebrativo do evento, de paz, alegria e festa. Porém,
admitiu que a grande beneficiada será a cidade de Palmas que terá seu nome
projetado mundialmente e se beneficiará com aspectos da infraestrutura que será
construída. Falou da complexidade da questão indígena em todo o mundo.
Questionado sobre as decisões dos povos e delegações escolhidas, disse que essa
decisão cabe unicamente aos irmãos Terena, Marcos e Carlos. Confirmou que a quase
totalidade dos recursos que serão gastos vem da iniciativa privada, ou seja, do
agronegócio e empreendimentos que poluem as águas, destroem a mata e exploram
os territórios indígenas.
Os participantes foram unânimes em afirmar sua postura
crítica diante dos Jogos, afirmando que a participação será nas ruas e que dão
total apoio à decisão do povo Krahô e Apinajé que já manifestaram sua decisão
de não participar. “Como podemos participar de uma festa quando os promotores
são os mesmos que estão matando nossos parentes Kaiowá Guarani no Mato Grosso
do Sul e em outras regiões do país?”.
Egon Heck – Fotos: Laila Menezes.
Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 26 de setembro de 2015.