ATL 2017

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terça-feira, 13 de agosto de 2019



Mineração em terras indígenas: genocídio anunciado


“Não estamos realizando uma audiência pública, mas um ato contra a mineração em terras indígenas”, ressaltou a deputada indígena Joênia Wapichana, de Roraima, ao dar início à manifestação pública e política na sessão por ela coordenada. Seguiram-se mais de duas horas de manifestações contundentes contra a anunciada mineração em terras indígenas. Nestes dias, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a sua decisão de abrir as terras indígenas à mineração. A decisão em si revela a intenção genocida, em atitude entreguista e autoritária e criminosa. As manifestações das lideranças indígenas de todo o país denunciaram com veemência, a manifesta intenção do atual presidente do país de abrir as terras indígenas à ganância frenética das mineradoras nacionais e multinacionais. A fúria do grande capital já está rugindo nas portas das terras indígenas. Conhecemos muito bem o desastre que tal atitude representa. Basta lembrar os séculos de extermínio dos povos originários, perpetrando em nosso continente, o maior genocídio da humanidade.
Estimando-se 70 milhões de mortos.

Não precisamos ir tão longe. É só lembrar os aproximadamente 1.500 Yanomami que morreram vítimas da massiva invasão de mais de 40 mil garimpeiros em seu território, no início da década de 1980. No território desse povo houve também, em 1993, o massacre de Haximu quando mais de uma dezena de Yanomami foram assassinados pelos garimpeiros. Poderíamos citar inúmeros casos de indígenas que morreram em decorrência dos processos de mineração e garimpagem em seus territórios, especialmente na Amazônia.

Não à mineração em terras indígenas

As manifestações unânimes contra a mineração em territórios indígenas ecoaram nos espações do Congresso como um alerta de vida contra os anunciados projetos de morte do atual governo.  Atitudes semelhantes já foram tomadas no início deste século quando os povos indígenas se reuniram em grandes assembleias nacionais e durante as discussões de propostas de Estatuto dos Povos Indígenas, fizeram chegar ao país e ao mundo sua posição radicalmente contrária contra qualquer tipo de exploração mineral em suas terras.

Os fortes interesses do capital nacional e internacional nunca abdicaram de suas intenções de rasgar o ventre da terra para se apossar impunemente das riquezas minerais.
No final dos governos da ditadura militar, em 1983, houve a tentativa do presidente Figueiredo de abertura das áreas indígenas à mineração, através do decreto de nº 88.985, assinado pelo presidente da República e pelos ministros Cesar Cals, de Minas e Energia, e Mario Andreazza, do Interior. O desastre que tal medida acarretaria, em termos ecológicos e principalmente em termos da sobrevivência física e cultural dos povos indígenas foi prontamente denunciado por entidades civis e pelo movimento indígena (A questão da mineração em terra indígena – Cadernos da Comissão Pró Índio/SP 1984), em âmbito nacional e internacional. Abaixo-assinados organizados no país e fora dele foram enviados ao presidente da República. O decreto não foi assinado, mas este não foi regulamentado.

Mineradoras e seus testas de ferro jogaram pesado e sujo no processo constituinte (1986-1988), atacaram o Cimi covardemente com mentiras e falsificação de documentos. Porém, não conseguiram fazer passar seus interesses escusos.
E agora voltam covardemente com as mesmas pretensões: saquear os minérios existentes nas terras indígenas.

Egon Heck
Secretariado Cimi
Brasilia, agosto 2019

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Índios do Maranhão em Brasília


Queremos nossa terra e nossos direitos
Nesta Semana Foram representantes do povo Apanjekra da Terra Indígena Porquinhos localizada nos município de Fernando Falcão. Também integraram a delegação indígenas do povo Memortumre Canela da aldeia Escalvado, município Fernando Falcão, Maranhão.


 As principais demandas  tem sido a regularização de seu territórios.
 A Terra Indígena de Porquinhos obteve portaria declaratória em 2009 assinado pelo Ministro da Justiça Taso . Portaria essa  posteriormente  anulada.
“No entanto, deixamos claro, que nosso povo não vai parar de lutar por nosso território. Nosso sangue foi derramado naquele chão, que para nós é sagrado, pelo f. estamos disposto  dar a nossa vida por nosso território  de nossos avós terem vivido livres em nosso território, se preciso for. Não temos medo de morrer para garantir o  Bem Viver para o nosso povo e nossa futura geração.” (em documento entregue nos gabinetes dos  Ministros do Supremo Tribunal Federal)


 No final do documento fazem um dramático apelo aos Ministros do  STF “portanto Senhores e Senhoras Ministros ouçam a voz do vosso coração, sintam o calor da mãe terra penetrando em seu corpo através de vossos pés. Deixem ser tocados pela mãe natureza que clama para ser preservada”.
As lideranças do povo Memurtum re denunciaram a construção de uma estrada que atravessa seu território causando muitas violências, conflitos e mortes r doenças. Além  disso a estrada está propiciando desastres e crimes ambientais. No documento de denúncia  elencam ainda a retirada de minérios. Acusam com responsável pela construção da estradas o prefeito Adailtom do município de Fernando Falcão.  Entre outros crimes destacam a violação dos direitos dos povos e comunidades indígenas que não foram consultados sobre a construção da estrada, causado genocídio indígena além da morte de dois indígenas José Caipar Canela e Jairo Cohruw Canela.

Auditórios  blindados e  aldeias abertas


Os indígenas conseguiram ultrapassara primeira barreira, mas encontraram um Congresso com portas dos auditórios intransponíveis, sendo obrigatório  uma senha para ter acesso aos espaços onde os indígenas queriam participar. Uma inovação, uma espécie de blindagem da democracia. No corredor, em frente das portas dos auditórios restou aos índio sentarem no chão  dos corredores. Será que eles tem medo de nos?
Uma das lideranças achou muito estranho não poderem entrar, ficando de pé ou sentados no corredor. “Na aldeia não acontece isso não. Nós recebemos bem todos os que  vem a nossas casas e aldeias. E perguntou: será que eles tem alguma coisa que querem esconder?
Muitos indígenas era a primeira vez que  saíram da aldeia para cidade grande. Tiveram medo em enfrentar as esteiras rolantes e elevadores.



Saudade da Constituinte – 30 anos depois
Acompanhei um grupo que foi visitar os gabinetes dos deputados. Em geral os indígenas foram recebidos com muita simpatia e promessas de apoiar os projetos  alguns gabinetes abriram seu pequeno espaço para receber toda  a delegação, tirar fotos e manifestações de respeito e carinho.
Porém não se poderia imaginar que depois de três décadas A Carta Magna se encontrasse tão desrespeitadas e sob forte pressão de retrocesso e descumprimento Os direitos indígenas em grande parte, mormente com relação à demarcação e garantia dos territórios, ainda não foi cumprida. Sequer o Estatuto dos Povos Indígenas foi aprovado, contribuindo para a situação caótica e avanço de setores anti-indígenas.
Valeu. A luta continua. Na avaliação durante essa semana em terra estranha viram e ouviram muitas coisas. Agora podem lutar melhor porque conhecem quem são seus amigos e seus inimigos Quem quer tomar as terras. Olhamos nos olhos deles. Eles não podem mais dizer que nós não existimos
Agora não temos mais medo. Fomos massacrados, mas agora estamos conhecendo, até o governo é contra nós.


Egon Heck
Cimi Secretariado
Brasilia,  12 de abril de 2019


quarta-feira, 10 de abril de 2019

Governo Bolsonaro: cem dias contra os povos indígenas




 Mais um lamentável recorde do atual governo Bolsonaro, na definição cruel de uma política indigenista do atual governo. Desde o primeiro dia de governo cumpriu o que havia prometido aos ruralistas e a outros interesses anti-indígenas “Não irei demarcar um centímetro de terra para os índios”. E para que essa promessa inconstitucional se tornasse realidade, seriam necessárias criar as condições objetivas para que se transformasse numa política de governo e não apenas uma promessa de um candidato em campanha. Daí a razão da Medida Provisória 870, com a qual o que restava da Funai foi esquartejada em vários ministérios e setores anti-indígenas. Foi um golpe mortal. Ou melhor pretendia abrir o caminho para o que as ditaduras militares e civis não conseguiram nesses cinco séculos: exterminar os povos indígenas. No início da ditadura militar, em 1964, os índios eram estimados em tono de cem mil sobreviventes, em menos de cinco milhões de hectares. Mas hoje são em torno de um milhão.
Nenhum governo dos últimos 50 anos foi tão contumaz e afoito contra os índios, em seus primeiros 100 dias de governo. Se de um lado, Bolsonaro foi tão longe em suas ações e promessas anti-indígenas, de outro, os inimigos dos povos indígenas parecem ter entendido tais ações como sinal verde para cometer todo tipo de violências, especialmente a invasão de terras indígenas já demarcadas para implantação de loteamentos e exploração madeireira. Com o total esfacelamento da Funai, está aberto o caminho para o pretendido extermínio.
Outra afirmação, inúmeras veze repetida pelos governos ditatoriais militares, é a de que os índios não são objetos de museu, mas querem ser como os demais brasileiros. Essa é a expressão na qual está embutido o desejo de um Brasil sem índios. Ou seja, os índios seriam “emancipados”, via decreto presidencial. Com isso, seus territórios seriam liberados para exploração do agronegócio, agricultura e pecuária especialmente. Esse foi o grande projeto do ministro do Interior, General Rangel Reis, em 1975. Os povos indígenas pareciam ter enterrado a proposta de Rangel Reis e seus aliados. Porém, mais de 40 amos depois, a proposta de “integrar” os índios à sociedade volta a ser proposta, dessa vez dentro dos 100 dias do governo Bolsonaro.

Ameaças permanentes de retrocesso


Antes mesmo de esquentar a cadeira de presidente, assinou, ainda no primeiro dia de seu mandato, a Medida Provisória 870, na qual atingiu o coração da política indigenista do Estado brasileiro. Estraçalhou a já moribunda Funai. Pedaços do órgão foram parar no colo dos ruralistas, como a responsabilidade pela regularização das terras indígenas. No campo da saúde, o governo Bolsonaro não tardou em propor a extinção da Secretaria Especial de Saúde Indígena, entregando o atendimento às prefeituras, e destruindo o modelo conquistado a duras penas através de inúmeros encontros e debates desde a aldeia até os seis encontros nacionais, através do subsistema da saúde indígena, assumidos nas seis conferências nacionais.
O mesmo processo acontece com relação à educação escolar indígena. Os professores indígenas, juntamente com suas comunidades, estão construindo com muita luta e determinação, um caminho de descolonização do sistema escolar implantado pelo projeto colonial. O agora ex-ministro, Vélez Rodriguez, demitido esta semana, vinha destruindo as bases que a duras penas foram sendo construídas pelos povos indígenas nas últimas décadas.

Permanente mobilização e luta do movimento indígena

Quando se conversa com os povos indígenas sobre os êxitos no enfrentamento com as forças e interesses que buscam exterminá-los, a resposta se reporta sempre aos aprendizados de cinco séculos de resistência. E essa resistência tem sido alcançada graças à profunda espiritualidade e a sua relação harmoniosa com a natureza.


O movimento indígena emergido na década de 197, teve como fundamentais e fundantes os processos das Assembleias Indígenas regionais e nacionais, iniciadas em abril de 1974. Em seguida, sustentaram o enfrentamento ao projeto de “emancipação”, que visava disponibilizar as terras indígenas ao capital expansivo do latifúndio. No bojo dessas lutas, o movimento indígena teve o surgimento de um importante movimento de apoio à causa indígena. Até hoje, várias dessas entidades continuam como adiados dessas causas, dentre elas o Cimi, o CTI, a CPI.
Outro momento fundamental das lutas do movimento indígena, foi o processo Constituinte. Dele se estaca o enfrentamento da mineração ávida para se expandir sobre os territórios indígenas. Um fato relevante desse período foi a tentativa de impedir a aprovação dos direitos indígenas na Constituição. Foi então criada a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, quando toda a trama mentirosa das mineradoras foi derrubada. Logo em seguida, em outubro de 1988, foram aprovados os direitos dos povos indígenas na nova Constituição. Apesar da intensa mobilização para conseguirem essa conquista, a luta continua até hoje. O Estatuto dos Povos Indígenas ainda não foi aprovado e está em curso um movimento nos três poderes no sentido e modificar e excluir direitos indígenas. Outro marco importante foi a Marcha e Conferência Indígena, Negra e Popular, realizada por ocasião das “comemorações dos 500 anos” do início da invasão dos territórios indígenas. Já no século 21 destacamos, a importante participação dos povos indígenas na Brasil nos três fóruns sociais mundiais, realizados em Porto Alegre, RS (2001, 2002 e 2003). Na sequencia, em 2004 se iniciou a realização dos Acampamentos Terra Livre, que são até agora os espaços políticos de denúncia e unificação de lutas dos povos indígenas.



Desde 2005, o movimento indígena continua levando adiante suas lutas através de suas próprias iniciativas, em nível dos povos e regiões, articulados em termos nacionais pela APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
As mobilizações são permanentes, para evitar qualquer retrocesso e exigir que sejam cumpridas a Constituição e a legislação internacional, relativas aos povos originários no mundo.
O mês de abril, é um dos momentos fortes de tomada de consciência da importância dos povos indígenas para toda a sociedade, de socialização e denúncia das violências a que continuam submetidos esses povos, bem como os povos tradicionais. É o momento de ampliar as alianças e avançar na luta.
Apesar da atual política indigenista sinalizar para o recrudescimento dos conflitos e violências, o movimento indígena tem acumulado bastante sabedoria para vencer estas novas batalhas.

Egon Heck
Fotos – Laila-Cimi
Brasília, abril 2019.

quarta-feira, 3 de abril de 2019

Sobrevivência humana depende das comunidades indígenas



Os líderes religiosos (nhanderu e nhandeci) veem com muita preocupação e apreensão o momento que estamos vivendo, o perigoso caminhar da humanidade. Na visão desses líderes, os indícios são de que o mundo vai acabar.




Enquanto um grupo de lideranças dos povos de Mato Grosso do Sul (Kaiowá Guarani, Terena e Kinikinau), participava de audiência no Ministério Público Federal, o Nhanderu Olimpio, sua esposa e mais um rezador, faziam seus rituais, pedindo proteção e forças para que os líderes dos povos originários sejam iluminados e sábios na luta dos direitos de seus povos. Com o semblante preocupado, prenunciou: “O mundo vai acabar. Os nhanderu que sustentam o mundo estão acabando”. E prosseguiu em suas preocupações quanto ao destino do mundo: “Os jovens estão perdendo a cultura”. Apesar dessa trágica ameaça que pesa sobre o desequilíbrio em que a terra está ameaçada em cair, apesar de tudo isso, “estamos, nós índios em luta por nossa terra”. “O nosso Pai do céu deu a terra para os índios. Por isso estamos lutando por nossa terra”. Lembrou ainda da abundância que tinham em suas terras, com muita mata, água boa, muita comida. “E agora acabou tudo. Tudo acabado. Mato não tem mais. Onde tem mato tem chuva”.
Coincidência ou não, um estudo recente que envolveu pesquisadores de 15 países, mostra que as práticas dessas comunidades com o manejo dos polinizadores são fundamentais para o meio ambiente e para o bem-estar do homem em nosso planeta (ver mais).

Espaço de resistência e violência

A visita à Comissão de Direitos Humanos, da Câmara dos Deputados, foi um dos momentos fortes. O presidente da Comissão, deputado Helder Salomão, foi muito receptivo ouvindo atentamente as denúncias da situação de barbárie contra os povos indígenas. Frisou que nesse momento inicial, sua gestão ouvirá a sociedade e seus clamores, visando fazer o enfrentamento às violências da melhor forma possível. Informou que mesmo antes de ser indicado para presidir a comissão, visitou os índios Tupiniquim e Guarani, localizados no Espírito Santo. “Vivemos tempos sombrios. Esta comissão será um espaço de resistência, de luta pelos direitos dos povos indígenas”.



Eliseu Guarani-Kaiowá expressou com veemência as violências a que estão submetidos no Mato Grosso do Sul. “Hoje estou aqui denunciando as ameaças que nós lideranças estamos sofrendo. Estando hoje aqui e amanhã não estarmos mais junto do nosso povo”. Para que o presidente e toda a Comissão de Direitos Humanos tenham uma noção mais realista do que está se passando com os povos indígenas no Mato Grosso do Sul, insistiram que fizessem uma visita à região.
Paulinho Terena afirmou que as lideranças de seu povo estão sendo massacradas: “Elas precisam de segurança urgente. Somos contra o arrendamento de nossas terras, contra a municipalização da saúde indígena. Queremos a Sesai fortalecida”.

Outra liderança Kaiowá Guarani, denunciou um descaso gravíssimo sofrido por uma indígena num hospital da região: “Somos maltratados e perseguidos. E nossa alma fica presa quando somos perseguidos. O genocídio dos povos originários continua. Mas não estamos amedrontados”.
Por fim, outras lideranças que se manifestaram na audiência na CDH pediram o fortalecimento da Funai para que esta possa cumprir a sua obrigação que é “demarcar nossas terras”. Ao invés de esquartejar a Funai, como fez o presidente da República no primeiro dia de seu mandato.
Depois de mais uma semana de presença em Brasília, permanece a firme decisão para que não haja retrocesso e perda de direitos. Retornaram a suas aldeias depois de muita mobilização, reza e luta. Partiram com a firme convicção de que os povos indígenas do Brasil vão avançar sem medo na luta por seus direitos.


Egon Heck
fotos\lailaCimi

Secretariado nacional do Cimi
Brasília, início de abril 2019.

quinta-feira, 28 de março de 2019

A beleza da vitória e a vitória da beleza e da diversidade













No Superior Tribunal de Justiça, a delegação indígena Pataxó foi recepcionada de maneira honrosa e respeitosa. Nenhuma restrição à maneira tradicional de suas vestimentas ou qualquer coisa do gênero. Foram recepcionados com dignidade na diversidade de suas maneiras de ser e viver.
Viram e ouviram com atenção, as decisões sobre a ação em julgamento. Momento gratificante para os guerreiros e lideranças que estavam neste recinto, ouvirem os oito juízes proferirem seus votos favoráveis aos direitos indígenas da terra indígena Pataxó, de Barra Velha-Monte Pascal, na região de Porto Seguro, Bahia.
De alma lavada e direito territorial conquistado, a delegação partilhou com sua gente, nas aldeias e seus aliados Brasil e mundo afora, que, apesar de tudo, são possíveis a conquista por direitos e mudanças profundas em nosso país. A vitória foi dos povos indígenas do Brasil. Um pouco de oxigênio em meio a cenários tão sombrios.


Direitos humanos: a difícil luta dos povos originários, oprimidos e empobrecidos do nosso país




No dia de ontem, mais um momento forte da luta pelos direitos dos povos indígenas no Brasil. Uma esperançosa união na luta pela vida, pela justiça e pela paz. A nova gestão da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, confirmou ser um espaço de resistência e de luta para evitar retrocessos e avançar na consolidação dos direitos humanos, étnicos e ambientais.











Dezenas de parlamentares e inúmeras organizações e entidades, manifestaram seu integral apoio e colaboração com a Comissão de Direitos Humanos.

Sonia Guajajara, em nome da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), denunciou as inúmeras iniciativas que estão sendo implantadas visando extinguir direitos e acelerar o genocídio contra os povos indígenas.



O presidente da Comissão, deputado Helder Salomão, insistiu na importância dos membros da comissão de ouvir a sociedade, e os clamores das vítimas da violência e do ódio que está sendo apregoado pelo atual governo.




Várias entidades e deputados, denunciaram veemente o anúncio da comemoração
do dia 31 de março, dia do golpe da ditadura militar. Isso representa uma apologia da tortura, da violência, o ódio e o retrocesso.

Hoje a delegação de mais de 100 indígenas está retornando para suas aldeias no sul da Bahia. A luta continua, pois só a mobilização desde as aldeias e comunidades poderá frear as tentativas de retrocesso de desconstrução de direitos. Outras delegações virão e darão continuidade às lutas contra a municipalização da saúde indígena, contra o esquartejamento da Funai e a entrega da demarcação das terras indígenas aos inimigos dos povos originários.


Egon Heck – fotos Laila/Cimi
Secretariado Nacional do Cimi
Brasília, 29 de março de 2019



domingo, 24 de março de 2019

Mais um guerreiro na casa do Pai





Thomaz partiu silencioso em sua derradeira “missão calada”. Foi mais de meio século de doação de uma vida a uma causa. Desde aquela Semana Santa de 1967, de maneira especial com seu companheiro Egydio, acenderam a chama de um novo indigenismo missionário, marcado por um compromisso radical e coerente com a causa dos povos indígenas, com respeito à vida, cultura, religião e autodeterminação desses povos.


Encarnação



Desde os primeiros contatos com os Kaingang e Guarani do Rio Grande do Sul, na década de 1960, foi construindo, em meio a dores e alegrias, dúvidas e certezas, um novo caminho missionário que veio a se concretizar na criação do Cimi – Conselho Indigenista Missionário, do qual participou de diversas formas, desde Conselheiro até vice-presidente e articulador da questão das terras indígenas. Também foi designado pela Missão Anchieta como diretor do internato de Utiarit, em Mato Grosso. Um processo lento, de dores e esperança, de coragem profética, de ousadia e fé.





Caminhos plurais e causa comum


A Missão Anchieta, na Prelazia de Diamantino, foi uma terra fértil para a afirmação de um novo indigenismo missionário de resistência e conquista de importantes direitos dos povos indígenas.
Aí também temos a fundamental contribuição de Thomaz. Sua sensibilidade aguçada, coragem e determinação, ele e Egydio tiveram a intuição de ajudar os povos indígenas no Brasil de darem um passo decisivo na luta e conquista de seus direitos, especialmente suas terras. Ao sentirem os povos originários em nosso continente se unirem e mobilizarem para enfrentar a opressão do sistema colonial, procuraram buscar um caminho solidariedade, apoio e visibilidade às lutas dos povos indígenas em nosso país.

Foi então que ajudaram os povos, especialmente as assistidas pelas missões católicas, num primeiro momento, a começarem a se visitar e reunir em grandes assembleias para debaterem sua causa, seus problemas e principalmente as formas de se apoiarem nas lutas por seus direitos.
Da aldeia ao Sínodo da Amazônia

Thomaz tornou-se semente de resistência, de novos caminhos possíveis e necessários em nosso ardor missionário e testemunho profético. Tua presença e partilha de vida com os Myky, é certamente um desses caminhos a emergir com vigor no Sínodo da Amazônia que se realizará em outubro desse ano.
Thomaz! Pagaste um preço alto pela tua ousadia e radicalidade, mas podes ter a certeza de que o sofrimento se transformará em semente e a semente em muitos frutos.

Abraço a meu melhor amigo, companheiro de luta e caminho

No dia em que encontramos Vicente Kiwxi, você Jaúka, aos prantos, bradaste por justiça: “Encontramos esse meu maior amigo... Chorei comovido, e, pensando na figura desse meu amigo, que tombava ali, insepulto até então, ignorado por todos, como ele foi durante muito tempo, por muita gente, que não dava valor ao tipo de trabalho que ele levava, que era de total respeito ao povo Enawenê Nawê” (Provocar rupturas, construir o reino, memória, martírio e missão de Vicente Cañas, Egon Heck e Paulo Suess, ed. Loyola, 2017).
Como afirmaste há poucos dias, por ocasião dos 50 anos da OPAN, teu batismo de fogo foi ajudar a sobrevivência dos Tapaiúna, que foram quase totalmente massacrados pela irresponsabilidade do Estado brasileiro, e que até hoje estão sem ter sua terra devolvida.
Thomaz, os povos indígenas são imensamente gratos, pois foste e continuas sendo um guerreiro dessa causa, agora junto a todos os que deram suas vidas por essa causa.


Egon Heck
Secretariado Nacional do Cimi
Brasília, início de outono de 2019.





quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

OPAN: meio século na luta pelos direitos indígenas




Dia de muito calor em Cuiabá, Mato Grosso.  Dia especial.  Momento de comemorar o meio século de existência da Operação Anchieta, posteriormente Operação Amazônia Nativa (desde 1987).  Além de ser a primeira entidade criada dentro do processo de surgimento de um novo indigenismo, no final da década de 1960 ela teve a mesma raiz e inspiração do Cimi, que seria criado quatro anos depois, por Egydio e Tomas, ambos jesuítas ligados à Missão Anchieta, em Diamantino, MT.
Momento histórico. Os idealizadores da entidade expuseram o contexto eclesial e social em que ousaram enfrentar conjunturas adversas para abrir um novo caminho de compromisso missionário, a partir de um novo e radical compromisso com os povos indígenas e as populações marginalizadas e oprimidas.

Essa rebelião que partiu do coração de cada um dos fundadores da OPAN, estava em sintonia e alimentada pela fé transformadora e necessidade de mudanças profundas. Como sentiam e vivenciavam essa realidade de dentro das estruturas, percebiam a necessidade de partir para outros caminhos, que não das missões tradicionais com estruturas de internatos. Os leigos seriam os que neste momento poderiam fazer a diferença, pois não tinham sobre si o peso das estruturas. Estariam mais leves e livres para um compromisso mais radical com os povos indígenas que estavam submetidos a um intenso processo de extermínio.

No dia 6 de fevereiro, a OPAN inicia a comemoração dos 50 anos de existência com a presença dos idealizadores e fundadores Egydio e Tomás e alguns dos primeiros voluntários que estavam atuando em projetos no norte do Mato Grosso e na Prelazia de Guajará-Mirim, em Rondônia.
Os fundadores da entidade expuseram os caminhos que os levaram a idealizar a entidade a partir da força e insatisfação presentes na juventude, submetida ao regime ditatorial militar e de uma Igreja que estava sendo impulsionada pelos ventos do Concílio Vaticano II, além de outros momentos fortes em nível de América Latina.

Tomas Lisboa expôs a histórica caminhada que resultou no desmonte a missão de Utiariti e o consequente deslocamento dos missionários para as aldeias. Também relatou seu batismo de fogo ao conviver por alguns meses com os Tapaiuna (beiços de pau), vítimas de mais uma ação criminosa do governo, que articulou o contato com esse povo, desencadeando a drástica redução de mais de 300 índios para uns 40 sobreviventes. E estes foram transferidos para o Parque do Xingu, onde aguardam até hoje seu retorno ao território original.

Egydio Schwade contou as peripécias enfrentadas ao procurar, em vários lugares do Brasil, voluntários que assumissem o desafio radical de conviver com os povos indígenas nas aldeias, num processo de encarnação, desde o aprender a língua do povo, até procurar ao máximo ser um deles. Foi nos seminários que ele obteve maior adesão à sua proposta. Lembrou que a OPAN no decorrer desse meio século de existência teve muitas mudanças e enfrentou muitos desafios. Porém, foi sem dúvida uma caminhada com muita dignidade e compromisso com os povos indígenas em nosso país.

OPAN e Cimi, uma mesma raiz e caminhos diversos


Houve uma sintonia e articulação muito intensa entre as duas entidades. Tanto isso é verdade que em determinados momentos, membros da OPAN passaram a trabalhar no Cimi e membros do Cimi eram também membros da OPAN. O primeiro secretário geral do Cimi foi Egydio que na ocasião era coordenador da OPAN. Nos dez primeiros anos, os missionários do Cimi faziam o curso de formação indigenista na OPAN.
O importante de toda essa história é que a causa indígena ganhou aliados de compromisso e confiança na luta por seus direitos e no enfrentamento das lutas contra seus inimigos.

Indígenas dão seu recado

A primeira mesa foi de representantes dos povos indígenas. Estes insistiram na importância de não apenas festejar, mas de aprofundar a aliança e solidariedade entre os povos originários para enfrentar com sabedoria, união e energia todas as adversidades que o atual governo pretende desencadear contra seus direitos.
As lideranças indígenas foram unânimes na avaliação da gravidade da situação com relação aos direitos dos povos indígenas. Esta situação exige uma permanente vigilância e mobilização para que não prevaleça o império da violência, da criminalização e retrocesso com relação aos direitos conquistados. Igualmente importante foi considerada a formação de quadros, de guerreiros, que façam o enfrentamento contra as forças adversas encasteladas no atual governo, com um discurso anti-indígena orquestrado pelo atual presidente.


Uma história de lutas e conquistas, solidariedade e alianças com os povos originários do Brasil.  Na abertura do evento Ivar, um dos históricos membros da entidade, fez referência às inúmeras ações que foram desenvolvidos nesses 50 anos. pela vida e direitos dos povos indígenas
Como Opanista e em seguida como membro do Cimi pude testemunhar e partilhar de inúmeras lutas, vitórias e derrotas dos povos indígenas em nosso país e outras regiões do continente americano

 
Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional