ATL 2017

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quarta-feira, 6 de julho de 2016

A possível volta dos militares à Funai




Não é nenhuma casualidade a proposta de um general no comando da Funai. Alguém poderia pensar: é o começo do fim da Funai! Semelhante afirmativa vem ao encontro de um desejo arduamente acalentado por grupos reacionários no Congresso Nacional. Não é preciso fazer muito esforço para perceber que atitudes do governo com relação ao órgão indigenista caminham nesta direção. Ou alguém ainda duvida que o decreto de morte da Funai já não está na mesa sem nenhum temor ou temer? As últimas iniciativas da política indigenista são o aviso prévio. Nada mais coerente do que ter um general no comando da Funai para anunciar o seu fim. Foi o que ocorreu quando da extinção do SPI, que tinha à sua frente o major-aviador Luis Vinhas Neves.

A bem da verdade, o indigenismo do Estado brasileiro nunca se distanciou daquilo que se desenhou como seu projeto histórico, ou mais precisamente, do projeto colonial de um Brasil sem índios. Quase mil povos foram reduzidos a um pouco mais de 300. Mas os massacres, extermínios, o genocídio, a legislação pombalina e dezenas de decretos de morte, não conseguiram consolidar as políticas e práticas assimilacionistas e integracionistas. Erraram quando anunciaram de forma triunfal que o Brasil chegaria ao ano 2.000 sem índios.

A insurgência e a revolta indígenas consolidaram um processo de resistência que nenhum cientista social se aventurou a prever. Nas últimas décadas os povos indígenas se transformaram num dos atores políticos mais contestadores da ditadura e do desenvolvimentismo em prática até hoje. Infelizmente o país ainda não garantiu aos índios espaço de futuro de paz e igualdade. Mas é exatamente com sua sabedoria milenar e resistência secular que se propõem a contribuir com a construção de um novo projeto de Brasil.
E nesta semana, povos onde a invasão começou, os Pataxó e Tupinambá do extremo sul da Bahia, estão aqui para dizer em alto e bom som, que nada tem a temer, que já aguentaram e enfrentaram muitos generais e que estão cansados do cinismo da política indigenista do Estado brasileiro. Fazem leis bonitas, mas continuam com práticas genocidas.
Qual será o futuro dos mais de 100 grupos isolados que vivem basicamente na região da Amazônia? Que será dos milhares de indígenas expulsos de suas terras e empurrados para as cidades? Que será das centenas de indígenas cujos territórios serão inundados por barragens ou atravessados por estradas e outros megaprojetos a serviço das mineradoras, madeireiras, agronegócio e inúmeros outros interesses do grande capital?
Estamos num momento delicado da história do nosso país. Vamos pensar o novo a partir da raiz, da resistência, da revolta.
No que depender dos povos indígenas e seus aliados, o balão de ensaio furou. Não aceitarão um militar de volta à Funai nos dias atuais. O que o Estado brasileiro terá que fazer sem temor, será uma profunda mudança nos rumos da política indigenista, mas em diálogo respeitoso e igualitário com os povos indígenas, com vistas a um processo de descolonização da política indigenista, de suas ações e de suas instâncias.
Da escola da retomada, à retomada da escola
Um grupo de professores indígenas de várias regiões do país também está em Brasília se unindo às vozes e movimentos dos povos originários para dizer não ao retrocesso e fazer avançar na articulação dos projetos de vida, teko porã, bem viver dos povos indígenas. Também estarão manifestando sua total solidariedade aos povos indígenas em luta por seus territórios, em especial os Guarani-Kaiowá e Terena do Mato Grosso do Sul.
Os  Tupinambá que ontem entregaram documentos em várias embaixadas assim se manifestaram: "Nós povo Tupinambá da região Sul da Bahia queremos mostrar o nosso apoio e solidariedade ao povo Guarani e Kaiowá, e nossa total comoção, revolta e indignação com os recentes e constantes ataques contra nossos parentes. Nós povos indígenas sofremos quase diariamente com ataques, criminalização e perseguições. Não bestasse o sangue que nossos antepassados derramaram por essa terra com o genocídio sofrido pelo povo indígena brasileiro. Terminam a carta dizendo"Querem nos exterminar, mas cada vez que morre um indio, serve como semente e brotam novos guerreiros, pois enquanto houver índio, haverá luta pelo que é nosso por direito, que é a terra".

Egon Heck
Fotos Laila Menezes
Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 5 de julho de 2016.