ATL 2017

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sexta-feira, 29 de abril de 2016

Terras Indígenas: antes tarde do que nunca



Está chegando ao fim mais um Abril Indígena, marcado por extrema violência contra os povos indígenas, com vários assassinatos, prisões, reintegração de posse, criminalização de lideranças. Também foi marcado por uma conjuntura de instabilidade democrática do país com um processo de impedimento da presidente Dilma.




Os povos indígenas, nas últimas décadas, nos momentos de instabilidade e quebra do regime democrático, foram duramente afetados. Porém, conseguiram resistir e sobreviver. Mesmo com a implantação do golpe militar/civil de 1964, os povos indígenas foram conseguindo visibilidade e forças para levar a denúncia da violação de seus direitos a instâncias nacionais e internacionais.

Enquanto isso, líderes ruralistas foram até o vice-presidente solicitar a utilização do Exército para impedir a luta dos povos indígenas, quilombolas, sem terra, na busca de seus direitos pelas terras para viver em paz e produzir para o sustento de seus povos e famílias. E logo se faz ouvir em tom ameaçador a voz do latifúndio, através de um de seus porta-vozes da grande mídia:
“Um exemplo de que a porteira está escancarada foi a espantosa liberação, em menos de um mês, de 30 processos de demarcação de terras que eram reivindicadas havia anos por índios e quilombolas. O ministro da Justiça, Eugênio Aragão, publicou de uma vez cinco portarias declaratórias em que reconhece terras indígenas cuja extensão supera a das áreas demarcadas nos últimos cinco anos” (Estadão, 28/04/16).

Nada a temer

Sônia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entende que os povos indígenas precisam aproveitar o momento: “Essa tempestade tem trazido frutos para nós. Então, temos que colhê-los. Ainda que seja tarde, o governo reconheceu que fez aliança com o lado errado”.




Para o ministro da Justiça, a reação do governo nesta fase atual de votação do processo de impeachment pelo Congresso, chega tarde, mas não pode ser desprezada: “Devíamos ter feito mais” (Correio Braziliense, 28/04/16).
Vale lembrar que Lula, ao terminar seu segundo mandato, reconheceu ter uma dívida com os povos indígenas, por não ter demarcado as terras, conforme havia prometido. Repassou a dívida histórica para a presidente Dilma, que por sua vez foi amontoando os processos de reconhecimento de terras indígenas, com clara sinalização de que não iria contra os interesses do agronegócio.

É notório que as terras indígenas que eventualmente terão seus processos de regularização contemplados com as iniciativas em curso, são fruto de constante mobilização dos povos indígenas, pois como dizia Antônio Brand (in memoria): “Nenhum palmo de terra indígena será conseguida sem luta”. 

Ao assinar as homologações de terras indígenas a presidente estará cumprindo determinação constitucional que exige do governo a demarcação e proteção das terras indígenas.

O Acampamento Terra Livre será realizado num momento forte, em que os povos indígenas poderão dar visibilidade às suas lutas por direitos, especialmente às terras e denúncia de violências e criminalização do movimento e as lideranças das comunidades.

Será também um momento de aprofundar as alianças com os movimentos sociais e populações tradicionais.    
    
Egon Heck – fotos: Laila Menezes/Cimi

Cimi Secretariado Nacional
Brasília, 29 de abril de 2016. 

domingo, 24 de abril de 2016

CPI do Cimi está indo para os finalmente




A CPI do Cimi instalada na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul em setembro de 2015 vai chegando ao seu final. A CPI tinha por objeto demonstrar que a atuação do Cimi no estado era de incentivar invasões de propriedades privadas e contribuir financeiramente com essas chamadas “invasões”, que os povos indígenas caracterizam como retomadas, ou retorno aos tekohá, territórios tradicionais. Para além desses objetivos explícitos sabe-se da articulação de interesses políticos e econômicos para inviabilizar o reconhecimento e demarcação das terras indígenas. Prova disso foram as presenças de convidados que proferiram “palestras”, visando demonstrar a atuação do Cimi, caracterizada como de ameaça à soberania nacional, dentro dos ditames da Teologia da Libertação e da Igreja progressista.

Presidente e secretário executivo do Cimi repudiam e esclarecem

Durante horas a fio os membros da Diretoria do Cimi esclareceram pormenorizadamente a atuação da entidade e repudiaram as insinuações de que seus membros estariam envolvidos em ações de instigação de invasões de fazendas. Tais acusações foram energicamente rebatidas, consideradas um absurdo. A entidade se pauta rigorosamente pelos princípios da Constituição Federal e o estatuto que rege as ações da organização, vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB. Quanto à acusação de que estariam sendo fornecidos recursos para os indígenas para a prática de ilícitos, o secretário do Cimi esclareceu pormenorizadamente as regras que segue no tocante aos recursos utilizados, provindos de diversas fontes, especialmente da cooperação internacional, e de organismos da Igreja Católica no Brasil. São realizadas auditorias independentes, regularmente, e feitos relatórios financeiros e de atuação e gasto dos recursos conforme a programação estabelecida nos projetos.


Presentes aliados e apoiadores nacionais e internacionais

Por ocasião do depoimento do secretário Cleber Buzatto, estiveram presentes representantes de organizações da União Europeia e de embaixadas de alguns países que apoiam os direitos dos povos indígenas e seus aliados. O Cimi tem buscado, no decorrer de seus 44 de apoio aos povos indígenas na conquista e garantia de seus direitos e suas vidas, a solidariedade e o apoio internacional aos povos indígenas e ao trabalho da entidade. Esse é um dos aspectos importantes, do compromisso do Cimi com os povos indígenas, pois se trata de dar visibilidade à luta desses povos no intuito de ampliar os seus aliados e apoiadores.

Ao longo das últimas décadas foi sendo construído o entendimento de que no apoio aos direitos indígenas vai consolidando um processo de conhecimento e solidariedade mútuo, que vai se traduzindo em estratégias de apoio aos direitos humanos e étnicos dos povos indígenas. Hoje existe uma ampla rede de apoiadores dos direitos dos povos indígenas.

Terra: a questão central

Para o Cimi, a falta de demarcação e garantia das terras indígenas tem gerado inúmeros conflitos em todas as regiões do país, tendo sido assassinados vários missionários em função do apoio aos povos indígenas na luta pela terra.




Em sua primeira Assembleia Geral, realizada em junho de 1975 assim foi definida a linha de ação com relação às terras indígenas: “Apoiar decidida e eficazmente, em todos os níveis, o direito que tem os povos indígenas de recuperar e garantir o domínio de sua terra, nos termos do Artigo 11 da Convenção 107 da OIT, uma vez que eles são os proprietários originários e parte integrante da mesma terra. Terra apta e suficiente para um crescimento demográfico adequado à sua realidade ecológica e socioeconômica”.

Todo e qualquer prazo e paciência já foram esgotados. Os povos indígenas não aguentam mais tamanha desfaçatez e ignomínia. Até quando se irá continuar chamando de “invasão” o retorno a seus territórios tradicionais – tekohá?

A grande questão que fica no ar é: por que o Estado não cumpriu sua obrigação de demarcar todas as terras indígenas, conforme ficou definido na Lei 6001, Estatuto do Índio, em que consta o compromisso de demarcar todas as terras indígenas até o ano de 1978. Em seguida, a Constituição Federal determinou que todas as terras indígenas fossem demarcadas em cinco anos, portanto até 1993. Até hoje o Estado não cumpriu a Constituição. Fica então no ar a questão: será que de fato se quer resolver esse grave problema que atinge os povos indígenas? O que os políticos e governos estaduais do Mato Grosso e posteriormente Mato Grosso do Sul, fizeram para cumprir esse preceito constitucional?

Os fatos apontam para uma tenaz resistência ao reconhecimento das terras indígenas em instância regional e nacional. Esta nova CPI segue tal estratégia, de negação dos direitos dos povos indígenas.
Mas sempre é tempo para lutar por aquilo que é justo e inegociável, como o direito a terra e à vida dos povos indígenas. E quiçá por suspiro fortuito das consciências responsáveis. Que a CPI do Genocídio e a CPI do Cimi possam contribuir para o equacionamento da gravíssima situação de violência e negação dos direitos fundamentais dos povos indígenas no Mato Grosso do Sul.

Texto e fotos: Egon Heck
Cimi Secretariado
Brasília, 22 de abril de 2016.




terça-feira, 19 de abril de 2016

Xakriabá em Brasília: semana histórica


Quando deixaram suas aldeias, no norte de Minas Gerais, talvez não tivessem a exata noção de tudo o que iriam passar aqui em Brasília. Particularmente os jovens guerreiros e guerreiras que eram a maioria da delegação.


Vieram com pauta específica: denunciar as violências e ameaças constantes, especialmente os Xakriabá de Cocos, na Bahia. Vieram também exigir da Funai a urgente regularização de suas terras, em processos emperrados há anos. Também tinham consciência da grave situação e riscos que correm os direitos indígenas, num Congresso mais conservador e reacionário do que nunca dantes nesse país. Vieram dar visibilidade a essa situação, e dizer em alto e bom tom que “direitos não se negociam, não se abre mão”, são sagrados e seu cumprimento é vital para a sobrevivência dos povos nativos em nosso país.

Agenda política e étnica

A delegação dos indígenas Xakriabá participou de uma intensa agenda conjuntural, ou seja, a semana em que se poderia haver, ou não, mudanças na Presidência do país. Os ânimos exaltados, as iras e os ódios espalharam-se no país de norte a sul, de leste a oeste. Criou-se uma grande expectativa em torno do desfecho da votação do impedimento da presidente Dilma, na Câmara dos Deputados.
Em torno desse fato, se estabeleceu forte mobilização e embate. Os indígenas ergueram suas bandeiras e faixas, juntamente com os povos e comunidades tradicionais e movimentos sociais. Ao dizerem não ao golpe, lembraram que a PEC 215 também é golpe. Matopiba também mata. Que golpes das elites no poder contra os direitos indígenas, praticamente começaram com o primeiro carregamento de pau brasil, nas naus portuguesas. Infelizmente os governos das últimas décadas também não se dignaram a cumprir a Constituição de 1988 ou o Estatuto do Índio de 1973, pois essa legislação exigia do Estado brasileiro, o reconhecimento e demarcação dos territórios indígenas, dentre outros direitos fundamentais.


Com ou sem bordunas

Tiveram alguns momentos em que foi necessário tomar decisões, a partir de seus direitos. Entenderam os guerreiros, por exemplo, de que, caso a polícia os abordassem, esta não poderiam proibi-los de portar ou tomar suas bordunas. Apesar de ter sido lembrado que isso já aconteceu em outros momentos, eles foram tranquilos, mas decididos a não abrir mão de suas bordunas. Tudo correu tranquilamente. Até no espaço onde falou o ex-presidente Lula e outras lideranças de movimentos sociais, lá estiveram eles com suas bordunas. Só acabaram impedidos de entrar no espaço das manifestações na Esplanada dos Ministérios.

Símbolo de resistência e de seus rituais, as bordunas estiveram com eles durante toda a semana. Foi uma semana em que as bordunas falaram, inspiraram os guerreiros, ouviram os encantados.

A violência no campo

Dentre os vários momentos formativos no Acampamento Brasil Popular, com várias falas sobre a gravidade do momento, também estiveram presentes no lançamento do Relatório de Violência no Campo, dados de 2015, articulado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Ouviram com atenção as estatísticas das violências e assassinatos de trabalhadores no campo. O geógrafo Ariovaldo Umbelino detalhou os dados decorrentes do não reconhecimento das terras indígenas e de sérios problemas de grilagem em terras na Amazônia. Afirmou que “a barbárie voltou ao campo brasileiro”.

O alerta para a esperança

Ao acompanharem a votação do processo de impeachment, puderam sentir as motivações personalistas e raivosas, num espaço em que não estão representados. Apenas foram lembrados por alguns aliados da causa indígena.

Apesar de todo o clima de acirrada disputa e tensões, a delegação Xakriabá partiu para suas aldeias na madrugada desta segunda-feira. Levam em sua bagagem imagens de uma disputa política histórica, que para eles, que vieram lutar por seus direitos, pelos direitos dos povos indígenas no Brasil, não se esgota neste momento. As lutas dos povos nativos têm raízes e razões muito aquém e muito além desse momento de disputa de poder.

Texto e fotos : Egon Heck
Cimi Secretariado

Brasília, 19 de abril, do dia do índio!

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Povos Indígenas no Brasil: 516 anos de golpes ?




“Nós resistimos a mais de 516 anos de golpes. Querem nos calar. Vamos gritar mais forte. Estamos dando continuidade à luta dos povos originários desse país. Estou indignado, mas não irado. Estamos prontos para a guerra. Se me matam vou renascer”.  Essas são algumas das manifestações da delegação dos índios Xakriabá, de Minas Gerais.


Um novo amanhecer

Mal os primeiros clarões de mais um belo dia de outono, se projetam sobre o Centro de Formação Vicente Cañas, e os Xakriabá iniciam seus rituais: pinturas corporais, afastamento de maus espíritos, agradecimentos e pedido de forças a Tupã e aos encantados. Terão pela frente uma missão nada fácil.  Lutar pelos direitos dos povos indígenas num contexto extremamente polarizado entre os que pleiteiam o impedimento da presidente Dilma e os que avaliam essa postura como um golpe. 

De uma coisa eles têm certeza: deverão estar unidos, articulados e mobilizados pelos seus direitos, seja lá qual for o desfecho da atual crise. Havendo impeachment ou não. É com essa convicção que partiram resolutos para o espaço do acampamento da Frente Brasil Popular, integrada pelos movimentos sociais, sindicatos, partidos políticos, povos e comunidades tradicionais, trabalhadores sem terra, movimento dos pequenos agricultores, atingidos por barragens, movimento das mulheres camponesas, dentre outros. Não alimentam ilusões diante da malograda política indigenista do atual governo, mas confiam no poder de transformação social a partir da luta e aliança de todas as vítimas históricas desses momentos de profundas crises econômica, política, social e ambiental. Continuarão exigindo seus direitos, independente dos desfechos conjunturais. A demarcação dos seus territórios será exigida, pois se trata de direitos constitucionais originários, portanto anteriores à criação do Estado brasileiro. Igualmente denunciarão, em fóruns nacionais e internacionais, as violências, a criminalização, as omissões e a falta de políticas públicas eficazes para a garantia de seus direitos. Estarão combatendo a PEC 215 e todas as iniciativas no Congresso, que visam tirar os direitos indígenas. Denunciarão a criminalização de lideranças indígenas, funcionários da Funai e aliados.

Na avaliação sobre as mobilizações, os guerreiros e guerreiras, em sua grande maioria de jovens, externaram sua crença de que tem sido positiva a presença junto aos movimentos sociais e a participação no momento informativo/formativo e na mobilização contra os “impérios e monopólios da comunicação”.  

Cobraram da Funai o andamento de processos de regularização de seu território e visitaram gabinetes de ministros do Supremo Tribunal Federal. Entregaram um documento no qual chamam atenção para ameaças a seus direitos. No final do dia, a delegação ainda participou de mobilizações do acampamento da Frente Brasil Popular.
Em carta entregue ao ministro do STF, Luiz Edson Fachin, expressam as preocupações de seu povo e dos povos indígenas do Brasil:
Nós, Povo Indígena Xakriabá, oriundos da margem do rio São Francisco, reunidos em Brasília-DF entre os dias 11 a 15 de abril de 2016 vimos até Vossa Excelência entregar esta respeitosa carta e requerer o que nela segue:
Nosso povo, assim como a grande maioria dos povos indígenas do Brasil, teve seu território roubado por fazendeiros sob a guarida do Estado brasileiro. Na luta pela demarcação, que já dura mais de um século, várias lideranças nossas foram assassinadas. Por esse motivo, a demarcação das nossas terras é uma dívida que o Estado tem com nossa gente.
Ademais, não admitimos que o marco temporal, discutido pelo STF, possa impossibilitar que nossas terras nos sejam devolvidas. Essa interpretação nociva da Constituição Federal tende a retirar o direito à terra de milhares de indígenas e quilombolas, por isso pedimos encarecidamente que possa ser contra mais esse ataque a nossos direitos garantidos no art. 231 da Constituição.

Por fim, pedimos a Vossa Excelência que possa contribuir com os povos indígenas e, para isso é necessário apenas a aplicação do direito indígena previsto na Constituição de 1988. Não aceitamos a retirada dos nossos direitos e, por isso, mais uma vez, rogamos por Vossa intervenção em nosso favor (Brasília-DF, 13 de abril de 2016. Lideranças Xakriabá).


Quem resistiu a mais de cinco séculos de golpes, massacres, invasões, etnocídio, genocídio e toda a forma de violências, certamente atravessará esse mar de incertezas, incólumes e dispostos a continuar contribuindo com a construção de um Brasil mais justo, com menos corrupção e mais solidariedade, mais democrático e participativo.

Egon Heck – fotos Laila/Cimi
Secretariado Cimi

Brasília, 14 de abril de 2016.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

O Brasil dos nossos sonhos




Dificilmente a questão indígena não será contemplada na agitação dessa semana em Brasília. O que estamos presenciando é uma forte disputa de poder e não de modelo de governo e Estado. E isso decididamente não faz parte da pauta de lutas pelos direitos indígenas. Na melhor das hipóteses devemos marcar presença contra possíveis retrocessos e retirada de direitos constitucionais de minorias como os povos e comunidades tradicionais.





Nos 44 anos de militância junto aos povos indígenas, da maioria das regiões do país, a convicção que em mim amadureceu é a de que de fato não existe espaço de sobrevivência e dignidade para os povos indígenas no atual modelo neoliberal. E isso em toda nossa Ameríndia e certamente no mundo inteiro. Os povos nativos estão empenhados em contribuir com sua sabedoria milenar e projetos concretos de sociedade, para salvar nossa casa comum, o planeta terra.

Nos últimos 12 governos do PT, desde a ditadura militar civil, de 1964, seguida de regimes autoritários de imposição de modelos desenvolvimentistas, em nenhum momento se viu sequer a disposição de cumprir a lei que estabeleceu direitos indígenas, como o Estatuto do Índio, de 1973, da Constituição Federal de 1988 e da legislação internacional, como a Convenção 169 da OIT e a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, da ONU. A prova mais cabal é a não demarcação e respeito das terras/territórios indígenas.

Se de um lado e outro da linha imaginária da disputa estiverem povos nativos originários, certamente não será para se somar aos gritos de “Impedimento já” ou “Golpe não”, mas será para lembrar aos dois lados de que os povos da secular resistência apontam para além da disputa do poder, lutam por modelos de Bem Viver, reconhecimento da plurinacionalidade de nossos países, para a democracia das aldeias, do consenso, do poder como serviço e não fonte de violência e corrupção.

“Alea jacta est” (a sorte está lançada).

Haverá disputa ferrenha no parlamento, nas ruas, na mídia. Acusações recíprocas cruzarão os céus como flechas incendiárias. É lamentável que tanta energia seja jogada ao léu, quando poderia ser canalizada para transformações profundas, urgentes e radicais, necessárias neste momento de nossa história. É lastimável que se estimule o ódio, a discriminação, o preconceito, em nome de escusos privilégios ou alienadas expectativas imediatistas e consumistas. É hora de termos além de consciência política, grandeza de espírito e coração generoso. É nessa direção que vai a contribuição dos povos nativos e seus aliados neste país.

Estamos em pleno abril indígena. Costumeiramente é o momento de mostrar ao país e ao mundo as violações dos direitos indígenas, as suas lutas e seus sonhos. O sonho de um país plural, que respeite e valorize os diferentes, os valores e sabedorias seculares, onde reine a justiça e seja banida a corrupção e violência.




Nossa América Latina já tem dado passos importantes em direção à construção de modelos de governos e Estados que deem conta das importantes realidades, da diversidade sócio cultural e das relações e direitos da Mãe Terra, a natureza tão violentamente maltratada e celeremente destruída.
Um país passado a limpo. Refundar o país.  Essas têm sido atitudes corajosas de nossos irmãos em países do continente. Quem sabe essa bandeira possa mobilizar milhões de brasileiros que estejam dispostos a forjar uma nova história, construir o Brasil de nossos sonhos.

Que os espíritos guerreiros e os encantados nos acompanhem para além dessa semana.


Egon Heck
Cimi Secretariado

Brasília, 11 de abril de 2016.