ATL 2017

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sábado, 23 de janeiro de 2016

Funai vai passar o chapéu


“A Funai (Fundação Nacional do Índio) vai recorrer a países como Estados Unidos, Alemanha e Noruega para reforçar o seu caixa em 2016. A decisão, confirmada pelo presidente da instituição, João Pedro Gonçalves, acontece após cortes no orçamento reduzirem os recursos da Funai ao menor nível em quatro anos” (UOL, 13/01/16).

Por ocasião da criação da Funai, no final de 1967, uma questão central debatida foi que caráter teria o órgão indigenista. Seria um órgão de Estado, que nesse caso garantiria os recursos para funcionamento, ou seria uma fundação, com possibilidade de captação de recursos de diversas fontes, privadas ou públicas, nacionais ou internacionais? Prevaleceu a segunda hipótese, sendo por isso denominada de Fundação Nacional do Índio.

Na prática, os governos da ditadura faziam questão de bancar a fundação, pois ela precisava estar sob controle. A Funai, por sua vez, buscaria controlar os índios. E com o máximo de rigor. Foi o que aconteceu. A Funai, que herdara 700 funcionários do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), depois de sete anos estava com sete mil.

Nos primeiros anos os recursos provinham em grande parte da exploração “empresarial” dos recursos naturais em terras indígenas, especialmente a madeira e do arrendamento de terras, que na verdade foi também um dos principais mecanismos para invadir os territórios dos povos nativos. O famigerado Departamento Geral de Patrimônio Indígena (DGPI) da Funai funcionou com a mesma filosofia de uma empresa. Os índios tiveram sorte de não prosperar a “mineradora Funai”, como propôs na década de 1970 o delegado regional de Manaus, “Cazuto Kavamoto”.


Funai: começo ou fim


O Estado brasileiro, desde que definiu sua política de integração e extinção dos índios, no início do século passado, sempre submeteu sua política com relação aos povos nativos e seus direitos, aos interesses das classes e elites dominantes. Portanto, não é de estranhar que o SPI tenha se transformado num antro de corrupção e violência nesse país. É só consultar o Relatório Figueiredo e o relatório da Comissão Nacional da Verdade para confirmar isso.

A Funai, com seus quase 50 anos de existência, com mais de 30 presidentes, foi alvo de severas críticas por parte dos povos e movimento indígena, que muitas vezes a qualificaram como “Funerária Nacional do Índio”. O deputado Mario Juruna, do povo Xavante, num de seus arroubos de indignação declarou que a Funai deveria se chamar “Fundação Nacional dos Coronéis”.

Hoje a Funai encontra-se esquelética e sucateada, sob o fogo cruzado de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), na Câmara dos Deputados, vendo seus orçamentos sendo reduzidos numa inequívoca prova de que  para o  governo nem de  longe a questão indígena é prioridade.

É também notório que a escolha de um político do PT, o ex-senador João Pedro, enquadrou a Funai no estreito corredor de aprovadora de projetos de interesse do atual governo e normalmente contrários aos  direitos dos povos indígenas.  A recente e apressada aprovação pelo presidente da Funai, da passagem do linhão de Tucuruí até Boa Vista, em pleno território Waimiri Atroari e contra a decisão dos mesmos, é mais um exemplo da nociva função política da Funai.


Ministério dos Povos Indígenas


No Chile, a presidente Bachelet, ao criar o Ministério dos Povos Indígenas afirmou que o ministério “colaborará com a criação e a coordenação de políticas e programas para fortalecer os povos indígenas, sua cultura, seus interesses, sua participação em debates importantes, como o da reforma constitucional, e assim evitar toda forma de discriminação arbitrária”. Criou também o Conselho Nacional dos Povos Indígenas, que deverá trabalhar junto com o ministério, e contará com participação de representantes das nove etnias indígenas reconhecidas pelo Estado – aymara, quechua, atacameña, diaguita, kolla, rapa nui, kawésqar, yagán e mapuche. Cada uma terá também seus conselhos específicos que trabalharão como instâncias regionais do Conselho Nacional
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É claro que criar estruturas que teoricamente são um gesto de valorização dos povos nativos, não necessariamente significa um passo incisivo para a autonomia e autodeterminação dos povos indígenas. Por essa razão os Mapuche, por exemplo, veem com certo ceticismo a criação do ministério. Caso a lei antiterrorismo seja acionada mais uma vez contra esses povos, haverá ministério que se contraponha a essas iniciativas de criminalização por parte do estado chileno?


Egon Heck
Cimi- Secretariado Nacional

Brasília, 02 de janeiro de 2016.