Thomaz partiu silencioso em sua derradeira “missão calada”. Foi
mais de meio século de doação de uma vida a uma causa. Desde aquela Semana
Santa de 1967, de maneira especial com seu companheiro Egydio, acenderam a
chama de um novo indigenismo missionário, marcado por um compromisso radical e
coerente com a causa dos povos indígenas, com respeito à vida, cultura,
religião e autodeterminação desses povos.
Encarnação
Desde os primeiros contatos com os Kaingang e Guarani do Rio
Grande do Sul, na década de 1960, foi construindo, em meio a dores e alegrias,
dúvidas e certezas, um novo caminho missionário que veio a se concretizar na
criação do Cimi – Conselho Indigenista Missionário, do qual participou de
diversas formas, desde Conselheiro até vice-presidente e articulador da questão
das terras indígenas. Também foi designado pela Missão Anchieta como diretor do
internato de Utiarit, em Mato Grosso. Um processo lento, de dores e esperança,
de coragem profética, de ousadia e fé.
Caminhos plurais e causa
comum
A Missão Anchieta, na Prelazia de Diamantino, foi uma terra
fértil para a afirmação de um novo indigenismo missionário de resistência e
conquista de importantes direitos dos povos indígenas.
Aí também temos a fundamental contribuição de Thomaz. Sua
sensibilidade aguçada, coragem e determinação, ele e Egydio tiveram a intuição
de ajudar os povos indígenas no Brasil de darem um passo decisivo na luta e
conquista de seus direitos, especialmente suas terras. Ao sentirem os povos originários
em nosso continente se unirem e mobilizarem para enfrentar a opressão do
sistema colonial, procuraram buscar um caminho solidariedade, apoio e
visibilidade às lutas dos povos indígenas em nosso país.
Da aldeia ao Sínodo
da Amazônia
Thomaz tornou-se semente de resistência, de novos caminhos
possíveis e necessários em nosso ardor missionário e testemunho profético. Tua
presença e partilha de vida com os Myky, é certamente um desses caminhos a
emergir com vigor no Sínodo da Amazônia que se realizará em outubro desse ano.
Thomaz! Pagaste um preço alto pela tua ousadia e
radicalidade, mas podes ter a certeza de que o sofrimento se transformará em
semente e a semente em muitos frutos.
Abraço a meu melhor
amigo, companheiro de luta e caminho
No dia em que encontramos Vicente Kiwxi, você Jaúka, aos
prantos, bradaste por justiça: “Encontramos esse meu maior amigo... Chorei
comovido, e, pensando na figura desse meu amigo, que tombava ali, insepulto até
então, ignorado por todos, como ele foi durante muito tempo, por muita gente,
que não dava valor ao tipo de trabalho que ele levava, que era de total
respeito ao povo Enawenê Nawê” (Provocar rupturas, construir o reino, memória,
martírio e missão de Vicente Cañas, Egon Heck e Paulo Suess, ed. Loyola, 2017).
Como afirmaste há poucos dias, por ocasião dos 50 anos da
OPAN, teu batismo de fogo foi ajudar a sobrevivência dos Tapaiúna, que foram
quase totalmente massacrados pela irresponsabilidade do Estado brasileiro, e
que até hoje estão sem ter sua terra devolvida.
Thomaz, os povos indígenas são imensamente gratos, pois
foste e continuas sendo um guerreiro dessa causa, agora junto a todos os que
deram suas vidas por essa causa.
Egon Heck
Secretariado Nacional do Cimi
Brasília, início de outono de 2019.