ATL 2017

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sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Presidente do Cimi no Curso de Formação


Há quase quaro décadas, quando começa um novo ano, reúnem-se missionários para aprimorar seus conhecimentos sobre os povos indígenas, partilhar experiências e obter informações que ajudam a aprimorar sua solidariedade e compromisso com os povos indígenas em luta pela vida e seus direitos.
Equivoca-se quem acha que o Curso de Formação Básica é apenas para jovens missionários, religiosos e leigos. Em 2016 são 37 os participantes do curso, com idade entre 25 e 82 anos, e de nove países da América do Sul, Europa e África.


A Formação no Cimi


Um dos aspectos relevantes dessa caminhada de 44 anos do Cimi são o zelo e carinho com que estabeleceu a prioridade da formação dos missionários indigenistas. Seus primeiros quadros foram ainda formados na Operação Anchieta (hoje Operação Amazônia Nativa). Com o tempo o Cimi foi se estruturando a partir dos cursos e encontros de indigenismo, realizados pelo Brasil afora, entre os anos de 1973 a 1977.

No início, os cursos de formação eram realizados em regiões onde havia maior número de missionários, especialmente na Amazônia, e por serem grandes as distâncias até o centro do país. Realizaram-se cursos de formação básica em Manaus e Belém.
Aos poucos o setor de formação da entidade foi traçando estratégias, tanto para a formação dos missionários como para lideranças e comunidades indígenas. Tais estratégias contribuíram para que se consolidasse uma presença solidária e de apoio cada vez mais eficaz à conquista e consolidação dos direitos dos povos indígenas.

Semente na terra é certeza de vida continuada. Vamos estar unidos aos nossos mártires e aos mártires indígenas que nos animam e dão força nas lutas e caminhada.

No início foi tudo muito custoso e difícil. Mas com a estruturação do Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia, foi dado um passo decisivo para a consolidação dos processos formativos e encontros neste espaço.

Hoje o Cimi mantém o Curso de Formação Básica em Indigenismo, etapas 1 e 2, cada uma com 20 dias. Além disso, a entidade mantem um processo de formação permanente, com estudos, encontros diversos por regiões e em nível nacional.


Dom Roque presente


Dom Roque Paloschi, o novo presidente do Cimi, eleito na XXI Assembleia Geral da entidade em setembro do ano passado, partilhou sua experiência missionária, particularmente na Diocese de Roraima, de onde foi bispo por vários anos. Com uma atitude de humildade - “espero não atrapalhar”-, mas com uma firmeza evangélica e política de sua missão como presidente do Cimi. Com certeza também contribuirá com os povos indígenas de Rondônia, para onde foi nomeado arcebispo de Porto Velho.

Nas reflexões que partilhou, enfatizou que “nós somos evangelizados pelos índios”. Chamou a atenção para a gravidade do momento para os povos indígenas, sendo muitas as pedras no caminho. Mas, segundo Dom Roque, isso não provoca em nós um desencantamento. Pelo contrário. Deve nos animar na fé e na esperança. Particularmente o Cimi, submetido a mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito, agora no Mato Grosso do Sul, pela defesa intransigente dos direitos indígenas, especialmente seus territórios/terras, sairá fortalecido, na certeza de que está no caminho certo, como aconteceu por ocasião do processo Constituinte (CPMI 1987).

Ressaltou a importância de o nosso processo de solidariedade com esses povos ser cada vez mais profundo e fecundo, nos encarnando nas realidades e lutas desses povos, na gratuidade e na nossa mística militante

Na celebração no final do dia, os participantes da etapa dois, deram seus depoimentos do que estão levando de tudo que partilharam e aprenderam nesses dias, tendo sido realizado o ritual do envio.


Egon Heck fotos Laila Menezes/Cimi

Cimi- Secretariado nacional

Brasília, 29 de janeiro de 2016.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Funai vai passar o chapéu


“A Funai (Fundação Nacional do Índio) vai recorrer a países como Estados Unidos, Alemanha e Noruega para reforçar o seu caixa em 2016. A decisão, confirmada pelo presidente da instituição, João Pedro Gonçalves, acontece após cortes no orçamento reduzirem os recursos da Funai ao menor nível em quatro anos” (UOL, 13/01/16).

Por ocasião da criação da Funai, no final de 1967, uma questão central debatida foi que caráter teria o órgão indigenista. Seria um órgão de Estado, que nesse caso garantiria os recursos para funcionamento, ou seria uma fundação, com possibilidade de captação de recursos de diversas fontes, privadas ou públicas, nacionais ou internacionais? Prevaleceu a segunda hipótese, sendo por isso denominada de Fundação Nacional do Índio.

Na prática, os governos da ditadura faziam questão de bancar a fundação, pois ela precisava estar sob controle. A Funai, por sua vez, buscaria controlar os índios. E com o máximo de rigor. Foi o que aconteceu. A Funai, que herdara 700 funcionários do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), depois de sete anos estava com sete mil.

Nos primeiros anos os recursos provinham em grande parte da exploração “empresarial” dos recursos naturais em terras indígenas, especialmente a madeira e do arrendamento de terras, que na verdade foi também um dos principais mecanismos para invadir os territórios dos povos nativos. O famigerado Departamento Geral de Patrimônio Indígena (DGPI) da Funai funcionou com a mesma filosofia de uma empresa. Os índios tiveram sorte de não prosperar a “mineradora Funai”, como propôs na década de 1970 o delegado regional de Manaus, “Cazuto Kavamoto”.


Funai: começo ou fim


O Estado brasileiro, desde que definiu sua política de integração e extinção dos índios, no início do século passado, sempre submeteu sua política com relação aos povos nativos e seus direitos, aos interesses das classes e elites dominantes. Portanto, não é de estranhar que o SPI tenha se transformado num antro de corrupção e violência nesse país. É só consultar o Relatório Figueiredo e o relatório da Comissão Nacional da Verdade para confirmar isso.

A Funai, com seus quase 50 anos de existência, com mais de 30 presidentes, foi alvo de severas críticas por parte dos povos e movimento indígena, que muitas vezes a qualificaram como “Funerária Nacional do Índio”. O deputado Mario Juruna, do povo Xavante, num de seus arroubos de indignação declarou que a Funai deveria se chamar “Fundação Nacional dos Coronéis”.

Hoje a Funai encontra-se esquelética e sucateada, sob o fogo cruzado de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), na Câmara dos Deputados, vendo seus orçamentos sendo reduzidos numa inequívoca prova de que  para o  governo nem de  longe a questão indígena é prioridade.

É também notório que a escolha de um político do PT, o ex-senador João Pedro, enquadrou a Funai no estreito corredor de aprovadora de projetos de interesse do atual governo e normalmente contrários aos  direitos dos povos indígenas.  A recente e apressada aprovação pelo presidente da Funai, da passagem do linhão de Tucuruí até Boa Vista, em pleno território Waimiri Atroari e contra a decisão dos mesmos, é mais um exemplo da nociva função política da Funai.


Ministério dos Povos Indígenas


No Chile, a presidente Bachelet, ao criar o Ministério dos Povos Indígenas afirmou que o ministério “colaborará com a criação e a coordenação de políticas e programas para fortalecer os povos indígenas, sua cultura, seus interesses, sua participação em debates importantes, como o da reforma constitucional, e assim evitar toda forma de discriminação arbitrária”. Criou também o Conselho Nacional dos Povos Indígenas, que deverá trabalhar junto com o ministério, e contará com participação de representantes das nove etnias indígenas reconhecidas pelo Estado – aymara, quechua, atacameña, diaguita, kolla, rapa nui, kawésqar, yagán e mapuche. Cada uma terá também seus conselhos específicos que trabalharão como instâncias regionais do Conselho Nacional
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É claro que criar estruturas que teoricamente são um gesto de valorização dos povos nativos, não necessariamente significa um passo incisivo para a autonomia e autodeterminação dos povos indígenas. Por essa razão os Mapuche, por exemplo, veem com certo ceticismo a criação do ministério. Caso a lei antiterrorismo seja acionada mais uma vez contra esses povos, haverá ministério que se contraponha a essas iniciativas de criminalização por parte do estado chileno?


Egon Heck
Cimi- Secretariado Nacional

Brasília, 02 de janeiro de 2016.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Povos Indígenas 2016: Cenários de muitas lutas



A PEC da morte não está morta. Um dos cenários mais prováveis é de que os ruralistas voltarão com toda força em 2016 para aprovar os projetos de seus interesses e antagônicos aos direitos indígenas, como a PEC 215 e a mineração e exploração dos recursos naturais em terras indígenas.

Será um ano de intensas disputas, de muitos interesses em jogo: olimpíadas, eleições. Estará o governo brasileiro disposto a cumprir suas obrigações constitucionais de demarcar as terras indígenas?




Portanto, será necessário manter a vigilância e a mobilização permanente dos povos indígenas e seus aliados, para evitar retrocessos e perda de direitos.

Quem acompanhou de perto os processos e lutas dos povos indígenas nessas quatro últimas décadas não tem dúvidas de que esses povos não apenas resistirão a todos esses ataques, mas que se juntarão a outras forças sociais para criar um país mais justo e plural.

Conferência Nacional de Política Indigenista: resultado pífio

Dezembro de 2015. Dias intensos de mobilizações, debates e decisões. Um verdadeiro levante nacional indígena. É inegável que houve um importante processo de mobilização dos povos indígenas em todo o país. Os encontros locais e as conferências regionais foram palcos de intensos debates em torno dos grandes desafios e ameaças que pesam sobre os povos indígenas em todo o país.  Além dessa necessária atitude defensiva houve sinalizações de avanços e mudanças mais profundas no sentido de superar os ranços colonialistas ainda presentes na relação do Estado brasileiro com suas populações originárias.

Porém, em termos de avanços efetivos na perspectiva de autonomia, participação na construção das políticas indigenistas e autogoverno, pouco se conquistou. O que se viu foi um governo investindo na manutenção de sua política indigenista com fortes marcas de paternalismo, cooptação e subjugado a um modelo desenvolvimentista. Neste cenário não se poderia esperar muito da Conferência Nacional de Política Indigenista, realizada em Brasília nos dias 13 a 17 de dezembro de 2015, com mais de 1500 participantes de mais de 100 povos.




As mais de 800 propostas aprovadas demonstram as dificuldades que enfrentam os povos indígenas numa realidade tão complexa, ampla, desafiadora, numa extensão territorial tão grande e uma diversidade social, cultural e política tão diversa. A expectativa é de que haja continuidade do processo através da regionalização das políticas dentro dos marcos nacionais aprovados. A pergunta que se impõem é: existe vontade política do governo para que isso aconteça? Terá o movimento indígena regional e nacional força suficiente para transformar as propostas em políticas efetivas e eficazes?
Demonstração inequívoca de que o governo não vai mudar sua submissa e desastrosa política indigenista foi a homologação pela presidente Dilma de apenas quatro terras indígenas, na Amazônia, em todo o ano de 2015. É a sinalização clara de que não haverá avanço na demarcação de terras indígenas, especialmente nas regiões centro-oeste, sul e nordeste.


CNPI: seis por meia dúzia


Um dos exemplos mais claros de que o governo não tem interesse em fazer mudanças substanciais nas políticas voltadas para as comunidades indígenas, é a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), apenas como “órgão colegiado de caráter consultivo”, ou seja, sem nenhum poder de decisão. Já em 1998, o movimento indígena entregou ao então candidato Lula, a proposta de criação de um Conselho com caráter decisório. A reivindicação foi assumida pelo candidato, mas nunca colocada em prática.

Lavando a alma




A mobilização e os rituais na cúpula do Congresso Nacional foram sem dúvida um dos momentos fortes de visibilização do processo de luta e reivindicações dos povos originários desse país. O espírito constituinte voltou a se manifestar com força. Numa demonstração clara de que a resistência histórica dos povos nativos continua presente e se manifesta nas lutas concretas em todo o país, e de maneira especial nesses momentos fortes de luta por seus direitos.

E para mostrar a vitalidade dos povos indígenas e seus caminhos de esperança lembro a importante criação do Fórum Nacional de Educação Escolar Indígena, criado pelos professores indígenas no início de dezembro, em encontro ocorrido no Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia. Será mais uma importante ferramenta na difícil construção da autonomia.

Egon Heck
Cimi Secretariado Nacional
4 de janeiro de 2016