Um início de semana em que Dourados, de cara lavada por
intensas chuvas, poderia conspirar como apenas mais uma semana. Porém quando o
presidente da Funai, Antonio Costa, desembarcou em Dourados, mais uma batalha
de insurgência foi deflagrada. Os Kaiowá Guarani, em numero de mais de 200
indígenas, cobraram com vigor guerreiro o descumprimento da Constituição que
ocasionou o assassinato de dezenas de indígenas nas últimas décadas no sul do
cone sul do Mato Grosso do Sul.
TAC Demarcação já
A batalha travada nesta última semana se deu quando já se
vão quase dez anos da assinatura de um Termo de Ajustamento de conduta (TAC)
para que todas as terras e territórios indígenas fossem regularizadas.
Estabeleceram-se prazos para que isso fosse realizado. Até 2009 as terras
deveriam estar todas identificadas. Porém, isso não se concretizou.
Prevaleceram mais uma vez os inimigos dos índios. O Estado brasileiro não
apenas se omitiu e curvou ante essas forças, como as transformou em práticas de
governo.
Quando o procurador federal em Dourados, Charles Estevan
Pessoa, estava participando de uma Grande Assembleia Aty Guasu na Terra
Indígena Yvy Katu, em 2007, estupefato se referiu à gravíssima situação das terras e direitos
Kaiowá e Guarani. “Se o governo, através da Funai, assumiu os direitos do vosso
povo como prioridade há cinco anos e neste período não regularizou nenhum palmo
de terra ao vosso povo, então vamos pensar juntos o que podemos fazer para
cobrar essa prioridade”.
No debate que se seguiu com as lideranças indígenas foi
definido o caminho da cobrança judicial, através de um Termo de Ajustamento de
Conduta, que seria assinado Pelo Ministério Público Federal (MPF), Funai e
lideranças Indígenas. Foi então escolhido uma delegação de 20 lideranças. No
dia 7 de novembro o TAC foi assinado, na sede da Funai, em Brasília. Marcio
Meira era o presidente do órgão indigenista.
As lideranças indígenas, na época, não tinham a ilusão de
que seria fácil fazer o que estavam no papel se transformar em realidade – no
caso, o reconhecimento dos direitos às terras tradicionais e originárias. E
junto com o MPF passaram a cobrar do governo a execução das demarcações dentro
do prazo estabelecido.
A violência contra o TAC
Porém, não previam que as reações fossem tão virulentas,
violentas e genocidas. Os governantes e poder econômico do Mato Grosso do Sul
se alvoroçaram em campanhas mentirosas e reações judiciais. Afirmaram que mais
de 20 municípios seriam extintos, pois se transformariam em territórios
indígenas. Afirmaram que mais de 30% dos 36 milhões de hectares do estado do MS
seriam destinados aos Kaiowa Guarani. Foram deflagrados muitos absurdos do
gênero.
Passaram então a paralisar as demarcações e trabalhos de
identificação, judicialmente, pela violência e ameaças.
Nesta semana tivemos portanto mais um lance dessa dramática
e criminosa política. O presidente da
Funai, Ministério Público Federal e lideranças indígenas debateram e definiram
a execução do TAC. Frente aos indígenas,
o novo presidente mais uma vez reafirmou o compromisso da Funai com o
cumprimento dos termos do TAC. Elizeu Kaiowá sintetizou a angustia e a
determinação dos Kaiowá e Guarani nas seguintes palavras:
“Mais uma vez a Aty Guasu veio receber o presidente da Funai
e esperamos que ele não esteja mentindo desta vez, já foram tantos que passaram
por aqui. Se não estivessem mentindo já teriam feito o que está no TAC. Desta
vez, na presença do presidente da Funai nós, todas lideranças, jovens,
rezadores, exigimos que a Funai demarque nossos territórios. Eles não nos
enganam mais. Não queremos continuar vendo nossas lideranças serem
assassinadas. Enquanto não demarcarem vamos continuar nossas retomadas”.
A Funai, pelo descumprimento dos prazos, já deve às
comunidades afetadas mais de dois milhões de reais. Porém não existem recursos
que tragam de volta as vidas sacrificadas nesses dez anos. Os Kaiowá Guarani
querem a imediata retomada das demarcações de seus territórios e que os
responsáveis por essa omissão sejam punidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário