ATL 2017

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domingo, 9 de setembro de 2012

Em Rondônia - Celebrando os 40 anos do Cimi


É tempo de celebração. Tempo de graça, de gratidão, de agradecimento ao Deus da Vida e aos povos indígenas por esses 40 anos de caminhada, de crescimento, de doação e presença solidária junto aos povos primeiros, originários desta terra.

Quando nos dirigimos a Nova  Mamoré para nos encontrarmos,  refletir e analisar a realidade, a partir da memória perigosa de décadas de luta  contra os opressores, dominadores e invasores dos territórios indígenas, ficamos  abismados com o cenário de destruição que vem sendo implantado com a construção das duas hidrelétricas – Santo Antonio e Jirau. Repete-se  o macabro cenário das quatro décadas de destruição: mata matada, capim semeado, implantando com a pata do boi a civilização desejada. Hoje mudam apenas os projetos, porém a lógica  perversa da acumulação e destruição continua a mesma. E as principais vítimas são novamente os povos indígenas,  com  seus territórios negados ou invadidos e saqueados.
Celebrando o testemunho, sangue derramado e presença solidária
D. Benedito Araujo, bispo de Guajará Mirim, presidiu a celebração na Igreja São Francisco de Nova Mamoré.   Igreja lotada. Pela primeira vez mais de trinta indígenas Wari, que são desta região, estiveram nos primeiros lugares da igreja. Tocaram sua flauta (hiruroi) e wakam (tambores). D. Bendito pediu perdão a Deus pelas vezes que a igreja foi omissa ou conivente, pelas vezes que os cristãos foram algozes e não irmãos solidários desses povos. Falou dos grandes projetos que continuam sendo implantados sobre os  cadáveres dos povos que ali viviam e que continuam sendo impactados e desrespeitados em seus direitos e sua dignidade.
Também falou da importância de celebrar os 40 anos do Cimi, que possibilitou uma presença missionária profética,solidária,libertadora junto aos povos indígenas   na região e em  todo o país. Ao lembrar  a  responsabi-lidade de todos  os cristãos pela ação missionária solidária e respeitosa com esses povos, pediu a Deus que nos livre dos preconceitos,  dos conflitos, dos projetos  de morte e de toda sorte de  males que trazem injustiça e opressão.
Nós missionários do regional Rondônia e participantes nesta XXVII assembleia também externamos nosso sentimento de  carinho e apoio solidário a esses povos,  dos quais  tanto aprendemos e que infelizmente continuam sendo tratados com descaso, preconceito ou racismo.
Rondônia que sonhamos
De povos felizes se respeitando, convivendo e se enriquecendo com os valores, sabedorias e conhecimentos partilhados.  Com a natureza respeitada, convivendo com a pluralidade da vida semeada por Deus e que não deve ser destruída pela primazia do boi, da soja ou da cana. Essa Rondônia queremos construir com os povos indígenas e todos aqueles que atingidos e explorados pelos grandes projetos,  com o acelerador de morte e destruição, implantado pelo atual modelo de desenvolvimento.

As constantes ameaças e violência sofrida pelo povos indígenas e nos últimos meses tendo-se intensificado contra o povo Kaxarari, localizados em Extrema – RO, que depois de muitas ameaças por parte dos fazendeiros e madeireiros que ilegalmente invadem seus territórios e não contentes com a ampliação do território, tem tomado proporção perversa, com o recente assassinato anunciado de João Kaxarari, sem que as FUNAI e Policia Federal e autoridades tomassem providencias para as constantes ameaças de morte que os lideres deste povo vem sofrendo, mesmo sendo notificados pelo povo, sobre as constantes ameaças de morte.

Nova Mamoré, 05 de Setembro de 2012.
Conselho Indigenista Missionário - Regional Rondonia

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Portaria 303 revogação já.avi

Portaria 303 – revogação não remendo
“ Não tenho problema em revisar a portaria. Ainda falta quase um mês em que ela continuará suspensa. Vou refletir.Precisamos de decisões, de soluções definitivas. O Supremo Tribunal Federal tem que tomar uma decisão”. Nessa linha foi a fala do Ministro da AGU,  Luiz Inacio Adams ao se dirigir aos indígenas reunidos no Ministério da Justiça, nesta manhã do dia 29. Ao pedido unânime das lideranças indígenas  de revogação, ele apenas reafirmou  que a portaria é apenas uma reprodução do que disse o Supremo Tribunal Federal.
Instalados em confortáveis cadeira do auditório do Ministério da Justiça, a delegação indígena de Goiás Tocantins e representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB e da Comissão de  Política Indigenista – CNPI, foram ouvidos pelo Ministro da Justiça,  José Eduardo Cardoso, o  ministro da AGU, Luis Inácio Adams, além de representante da Secretaria Especial da Presidência da República e da Funai.
Remendar uma portaria inconstitucional e anti-indígena não é possível. Qualquer tentativa de alterar a portaria, só faria piorar a situação.
Rasgue, revogue, queime, acabe com essa portaria
“Nois não quer essa porcaria, de jeito nenhum..isso aí não é justo, porque querem acabar com nois.” disseram inúmeras vezes as lideranças indígenas. Lembraram ao ministro Adams que a portaria é inconstitucional e que é função da AGU defender os interesses da União, e que as terras indígenas são da União e que portanto ao invés entregar nossas terras e abrir para a exploração, demarquem e as protejam. “Essa portaria é a morte dos povos indígenas. Deixem nós viver em paz. Estão aumentando as violências contra nossos povos”
As manifestações indígenas foram pedindo a imediata revogação da portaria (porcaria). E mais do que isso “rasgue ela. Diga isso pra nós. Isso não é justo.  Não aceitamos a portaria”, disse Maria das Flores Kraho, gesticulando indignadamente.
Os indígenas ainda registraram sua indignação pelo desrespeito com que foram tratados “nós não somos bandidos. Precisava chamar uns quinhentos policiais? Porque fecharam as portas na AGU e no Ministério da saúde?, clamou Antonio Apinajé.
Essa portaria em muito se assemelha à  proposta de “Emancipação indígena”, proposta pelo general Rangel Reis, então Ministro do Interior, em 1976.  A verdadeira intenção era emancipar as terras indígenas e em 20 anos ver um Brasil livre de índios. A reação dos povos indígenas e de seus aliados em nível nacional e internacional foi imediata e contundente. Apesar da resistência, após  rasgarem o projeto numa Assembléia Indígena nacional, realizada em Goiás Velho, o então ministro sepultou definitivamente seu projeto. Se espera o mesmo do ministro da AGU, com relação à portaria 303.
Saúde fechada
Depois da delegação dos  oito povos indígenas de Goiás e Tocantins permanecerem por mais de duas horas diante das portas trancadas, finalmente foram convidados a conversar com funcionários do terceiro escalão.  Uma delegação foi para a conversa com os funcionários da Sesai. Permaneceram por quase cinco horas colocando suas reivindicações diante do descaso do órgão e da dramática situação da saúde na maioria das aldeias.

Diante das evasivas e argumentações inconsistentes dos funcionários do órgão, as lideranças indígenas saíram do diálogo profundamente decepcionados e revoltados.
Para o cacique Marcos Xukuru, foi desrespeitosa a forma como a Sesai tratou a delegação indígena “coloca um substituto já com a intenção de que nada se resolva, que tudo fique como está...Acho negativa e desrespeitosa a atuação da Sesai”.  A mesma impressão foi manifestada pelas lideranças dos povos indígenas de Goiás e Tocantins. Em função disso estão solicitando uma audiência com o Ministro da Saúde, para pedir algumas providências urgentes, inclusive com a substituição de funcionários da região.




terça-feira, 28 de agosto de 2012

Adams, da AGU, foge de indígenas



"Então diga para ele vir aqui. Queremos olhar no olho dele e dizer pra ele rasgar essa portaria...' bradou  Maria das Flores Krahô  inquirindo o vice-de Adams, Rafael , apontando com o dedo e gesticulando com veemência " Foi o senhor que assinou esse papel? Foi o senhor que escreveu isso? Não foi. Então nós queremos falar com ele que fez, o Adams.". Inquirições e pedidos de revogação (acabar, rasgar, terminar...)   forram feitos por mais de uma dezena de indígenas dos povos Xerente, Kraho, Apinajé, Karajá de Sambioá, Avá Canoeiro,  Tapuia, Kraho/Kanela, Krikati e Xavante que vieram ao prédio da Advocacia Geral da União-AGU com o único objetivo de dizer ao ministro Adams que revogue a portaria  303, por ele assinada e publicada dia 17 de julho deste ano. Ao deixarem o predio, às 19,30 horas estavam, em frente ao mesmo, três microônibus  de militares e várias viaturas.
Portas trancadas

Ao chegar ao prédio da AGU a delegação de indígenas dos estados de Tocantins e Goiás, às 14,30 horas encontraram as portas fechadas. Em vão, tentaram com que elas fossem abertas para que eles pudessem  se encontrar o  ministro da AGU.  Movidos pela decisão de falar com quem assinou a portaria, vieram preparados para passar aí a noite se preciso fosse.
Com o passar do tempo foi se aglomerando gente em frente à portaria. Não tardaram a chegar policiais. Os indígenas conseguiram impedi r o fechamento total de uma das portas, o que começou a gerar temor nos funcionários do prédio que só acalmou quando chegaram negociadores da Funai e da Secretaria especial da presidência da República e o vice presidente da  AGU. Todos se dirigiram ao refeitório, onde se iniciou uma reunião de mais de duas horas. A maioria dos indígenas ficaram em pé, indignados exigindo a presença do Ministro da AGU no local para ouvi-los e receber o documento.
Negociação e protesto

Nas falas duras, não faltaram as gesticulações, o dedo em riste,  a batida forte das bordunas sobre a mesa,  e o rasgar da portaria em frente aos representantes do governo. O Avá Canoeiro Davi, enquanto rasgava a portaria, pedia para que dissessem ao Adam que o seu povo está aguardando  a demarcação de suas terras. Diego Avá Canoeiro complementou enviando um recado a Katia Abreu de que a portaria seria  revogada.
As mulheres foram  as que fizeram as falas mais veementes " Chame o Adams. Vamos ficar aqui até que ele venha. Nem que precisa ficar a noite toda aqui. Trouxemos nossa boroca para dormir aqui. E vocês vão ficar aqui também.  Quando os guerreiros ameaçaram fechar a porta, rapidamente seguranças se postaram ao lado das mesmas.
As lideranças pediram que ligasse ao ministro pedindo que ele viesse até ali, ao menos por uns cinco minutos para receber o documento e eles poderem olhar no olho dele e falar seus sentimentos contra a "portaria da morte dos povos indígenas".
 Após muitos desabafos e unanime pedido de revogação da portaria e diante da relutância do ministro da AGU de vir ao local, dizendo estar em reunião com a presidente Dilma, as lideranças concordaram em marcar um dia e horário para essa conversa.  Ficando definido um encontro para quarta feira, dia 22 às 10,30 horas, no Ministério da Justiça ou no Palácio do Planalto.
Logo apos  a  mobilização na AGU a delegação indígena se dirigiu para o Supremo Tribunal Federal, onde o ministro Ayres Brito estava assinando a revogação da ação de paralisação da hidrelétrica de Belo Monte. a ironia e cinismo dda burocracia ficou manifestada em diversas afirmações, dentre elas a de que não haveria espaço para receber toda a delegação (55 pessoas). Ao que os índios responderam: Não tem problema, nois fica de pé mesmo. Nosso costume na aldeia é reunir toda a comunidade.
Apesar da palavra dos negociadores do governo, várias liderranças manifestaram sua desconfiança: Será que Adams virá?

Egon Heck e Laila Menezes
Povo Guarani Grande Povo
Cimi 40 anos, 28 de agosto de 2012


domingo, 26 de agosto de 2012

Guerreiros da Paz



Os  povos Indígenas do Mato Grosso do Sul tiveram mais uma semana intensa de  mobilização na luta pelos seu direitos, especialmente seus territórios, condição básica para a verdadeira paz no Mato Grosso do Sul. Os fazendeiros alardearam na imprensa regional a declaração de guerra contra os Kaiowá Guarani, que estão retornando às suas terras tradicionais. Descrentes de qualquer avanço na garantia de suas terras, por parte do governo federal, resta-lhes a fidelidade a seus lideres religiosos (Nhanderu) que decidem o que fazer.
Participaram do 20 Congresso camponês "Encontro Nacional Unitário dos trabalhadores e Trabalhadoras e Povos do Campo, das  Águas e das Florestas.
Diferentemente do que ocorreu há 51 anos, quando se realizou o primeiro Congresso Camponês, em Belo Horizonte, agora os povos indígenas estavam ali presentes, articulados, dando seu recado e sua efetiva contribuição para construir uma unidade das populações de vivem no campo. Naquela ocasião a população indígena  era estimada em menos de 100 mil pessoas, destinadas ao desaparecimento. Hoje, conforme os últimos dados do IBGE são quase um milhão,  falando 270 línguas e constituídos em 305 povos. Mas não apenas tiveram um grande aumento demográfico, como se constituíram em importantes atores políticos e sociais, protagonistas de importantes lutas no campo.
Em Brasília, além de participar dos debates e mobilizações de milhares de camponeses, quilombolas e populações tradicionais, estiveram  com dezenas de representantes de organismos do Estado brasileiro. A ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário ouviu atentamente a denúncia das violências e ameaças que pesam sobre inúmeras comunidades e lideranças indígenas na região. A declaração publica de guerra a essas populações, tem sensibilizado a Ministra, que se comprometeu  empenhar-se na investigação dos crimes praticados, bem como  buscar segurança para as comunidades e lideranças ameaçadas, particularmente no sul do cone sul, na fronteira com o Paraguai. Além disso comprometeu seu empenho para a agilização da demarcação e garantia das terras indígenas no estado, razão de tanta violência e conflito. E sinalizou com a sua ida à região para melhor sentir essa realidade  que desafia e envergonha o país. Enquanto estavam com a ministra, informações da área denunciavam mais um ataque à comunidade, na qual havia sido destruído barracos  dos indígenas da retomada de Arroio Korá.
Protocolaram documentos no Supremo Tribunal Federal, solicitando  urgência no julgamento dos vários processos envolvendo as terras indígenas, como Nhanderu Marangatu, Arroio Korá, que já forram homologadas pelo presidente Lula e que estão liminarmente suspensos.
Na  AGU - racismo explícito
A delegação indígena do Mato Grosso do Sul também foi registrar seu protesto contra a portaria 303. Quiseram entregar ao presidente do órgão Luiz Inácio Adam,  documento pedindo a imediata revogação da portaria, unindo-se ao clamor dos demais povos indígenas do país, que unissonamente vem reiterando esse pedido. Foram informados de que ele não se encontrava no trabalho e não tinha previsão de retornar ao prédio. (verdade ou blefe?).  Lindomar Terena entregou o documento ao assessor deixando claro que  assim como já passaram ali inúmeras delegações com o mesmo pedido, isso continuaria até que fosse assinada a revogação dessa portaria.

Enquanto os indígenas aguardavam no saguão do prédio, uma senhora, bem vestida, ao sair da porta e se deparar com os indígenas, mostrou o quanto esse país ainda é racista, ao declarar "aqui tem mais índio do que gente". Alguns indígenas imediatamente disseram que ela tivesse cuidado com que fala. Ela apenas apressou o passo em direção à rua.  Esse fato  foi relatada ao representante da AGU
No Palácio do Planalto "pacificar"
No quarto andar do Palácio do Planalto mais de uma dezena de representantes de órgãos e instituições ligados fundamentalmente aos direitos humanos e segurança, haviam sido convocados pela Secretaria Especial da Presidência da República, para discutir as medidas cabíveis diante das últimas violências no Mato Grosso do Sul, com o desaparecimento do indígena Kaiowá Guarani, Eduardo Lopes e a morte de uma criança, em conseqüência do ataque à retomada no Arroio Korá, município de Paranhos.
Durante quase duas horas foram feitos os relatos dos acontecimentos pelas lideranças indígenas e solicitado providências urgentes, especialmente por parte dos órgãos de segurança, mormente, a Polícia Federal e a Guarda Nacional.
Diante da urgência de medidas de proteção às comunidades e lideranças ouviram, tanto dos representantes dos órgãos de segurança quanto da  presidente da Funai, a informação de que não seria possível fazer determinadas ações de segurança devido ao corte de verbas para as diárias e passagens.
Porém foi anunciado a solicitação de condições para a presença de efetivo da Guarda Nacional em Paranhos e Iguatemi.
Como a palavra de ordem era "pacificar o Mato Grosso do Sul", foi anunciado pela secretaria Especial da Presidência da República a ida de uma delegação do governo federal àquele estado com o intuito de dialogar com o governo e órgãos locais, na perspectiva de apaziguar a situação, "sem abrir mão da demarcação das terras indígenas" (Paulo Maldos)
Os guerreiros da paz, tiveram mais uma missão de exigir justiça, diante da guerra que lhes foi declarada. Aguardam ativamente as providencias prometidas.

Egon Heck -    www.egonheck.blospot.com.br
Povo Guarani Grande Povo
Cimi 40 anos , 25 de agosto de 2012




quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Guerra Secular



A guerra contra os Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul, declarada  secularmente, volta a ser reafirmada.  Atualizada, esta guerra genocida, ininterrupta, ganha contornos inimagináveis em qualquer parte do mundo neste século 21.



“Poucos aceitam falar, mas admitem articulações que já consideram a contratação de homens para uma ‘guerra’...Conhecido como ‘Lenço Preto’, há 35 anos Luis Carlos da Silva Vieira é proprietário de uma área a poucos quilômetros da Fazenda Campina e diz que está convocando os fazendeiros da região para a ‘guerra’. Ele tem gado na área já ‘retomada’.“Se o Governo quer guerra, vai ter guerra. Se eles podem invadir, então nós também podemos invadir. Não podemos ter medo de índio não. Nós vamos partir pra guerra, e vai ser na semana que vem. Esses índios aí, alguns perigam sobrar. O que não sobrar, nós vamos dar para os porcos comerem”, dispara.O fazendeiro conta que já houve conversas com outros produtores da região e confirma que o conflito armado já é considerado uma opção. Ele diz que a intenção é aguardarem até a próxima semana, para então agir caso não haja novidades favoráveis.“A maioria dos fazendeiros está comigo. Arma aqui é só querer. Eu armo esses fazendeiros da fronteira rapidinho, porque o Paraguai fica logo ali, e na guerra não tem bandido”, avisa.
Tem um fazendeiro conhecido aí da região que falou pra todo mundo aqui: posso até sair, e entregar para os bugres, mas assim que a poeira baixar, eu lavo essa terra de sangue”, relata um dos produtores que falaram com a reportagem.Vieira confirma que a contratação de pistoleiros paraguaios é uma opção para os produtores rurais reagirem. “Eu acredito que vai ser por aí. A guerra vai começar aí. Eu, como a propriedade lá não é minha... Se é minha, já tinha índio estendido à vontade aqui”, diz apontando para o campo às margens da rodovia.”(Midiamax,18-08-2012)
Diante da eminência de mais ações genocidas, os Kaiowá Guarani reafirmam : “Acreditamos na paz, somos da paz verdadeira, nos não temos armas de fogos destrutivos à vida humana. Queremos sobreviver. Por fim, repudiamos reiteradamente a violências contra a vida humana.  Sim, temos somente nossos cantos e rezas sagradas mbaraka e takua para buscar e gerar a paz verdadeira à vida humana. Neste sentido, nós vamos e queremos ser morto coletivamente cantando e rezando pelos pistoleiros das fazendas. Esta é nossa posição definitiva diante da ameaça de morte coletiva/genocídio/etnocídio anunciada publicamente pelos fazendeiros da região de faixa de fronteira Brasil/Paraguai.” (Conselho da Aty Guasu, 18-08-2012)
Nos caminhos da dor e esperança
Andando pelas aldeias e acampamentos Kaiowá Guarani, os sentimentos afloram em dor e esperança a cada passo dessa história de resistência e afirmação da vida, em meio à guerra declarada e a dor manifesta em cada sentimento reprimido, em cada família rompida, em cada casa destruída, em cada vida partida,
Andamos com a alma na mão e o coração acelerado pois em cada comunidade, acampada ou confinada,  os gritos de dor ou alegria se repetiam com muita intensidade.
Em Laranjeira Nhanderu, onde partilhamos belos momentos de luta e resistência, encontramos uma comunidade abalada pela morte inesperada do Zezinho. Um forte vendaval de ressentimentos e sentimentos submersos, emergiram transbordando em agressões, ódio, lágrimas e disputas. Provavelmente só o tempo irá restabelecer a paz e harmonia entre todos.
Já em Itay um grupo nos aguardava, com o sorriso largo e constante dos Kaiowá Guarani. Tomando terere (mate com água fria) relataram orgulhosos o clima de paz, após a publicação da portaria declaratória da terra. Porém está tudo parado. Ainda não foi feita a demarcação física. Não entendem por que a demora da Funai neste aspecto. Também sentem a ameaça de moradores de uma vila que está dentro da área, e que disseram que iriam colocar veneno na caixa d’água que abastece a comunidade indígena.

Seguimos para Guirá Kambi’y, onde nos receberam com ritual, enfrente e dentro da oga pysy ( casa de reza) que estão acabando de construir.
Nas periferias de Dourados, vimos as duas áreas retomadas, Boqueirão e Nhum Verá com muito mais barracos do que em tempos passados. As lideranças relataram com orgulho o que conseguiram plantar e as pequenas conquistas, dentro de uma realidade de muita necessidade, caristia e pobreza.
Com Damiana, guerreira destemida, lutadora incansável,  fomos a mais uma “via crucis”,  caminho da dor, da visita ás cruzes onde estão sepultados seus dois filhos recentemente mortos por atropelamento. Ela, mais do que ninguém conhece a dor das estradas que matam. Já teve o marido e três filhos mortos por atropelamento. E ali está ela o asfalto, a cerca e a cana, resistindo bravamente, no tekohá Apika’y.
No acampamento Takuaju Laranjal,  encontramos uma comunidade fragilizada por muitos conflitos internos e abalada com o recente suicídio de uma mãe, que foi enterrada à beira da estrada, próximo ao local onde  fora queimada uma indígena do grupo há alguns anos. O fato de não terem sido incluídos nos Grupos de Trabalho de identificação de todas as terras Kaiowá Guarani e não terem até o momento nenhum sinal positivo neste sentido, os deixa bastante desanimados.
Nos caminhos da dor há esperança. Nos caminhos da guerra secular enfrentada pelos Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul, existem as brisas que suavizam o sofrimento e não deixam morrer a esperança, mesmo em meio a tantas mortes e violência. A resistência desse povo da paz sinaliza e nos convoca para outros jeitos de vida, para além do brutal sistema da acumulação, da agressão á terra e sua gente.
Egon Heck e Laila Menezes
Povo Guarani Grande Povo
Cimi 40 anos, agosto de 2012