ATL 2017

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quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Pedágio Indígena



Prontamente o cacique Aurelio Tenharim dá outra interpretação “a gente não fala de pedágio, fala de cobrança de compensação. Ela nunca vai pagar a dívida. Nós éramos 30 mil tenharins, hoje somos 800. Os jeahoy foram quase extintos. Claro que o povo tenharim tem deixado aberto para negociar com os governantes. Esperamos quatro anos para sentar na mesa de negociação, mas nenhum órgão se manifestou. Ninguém levou a sério essa cobrança de compensação da parte do governo.
Continua o cacique Aurelio  “a Transamazônica tem história de massacre, de estupro de nossas índias, escravos, violação de direitos. Quem vai pagar isso? Essa compensação não está só na fala, está no Ministério Público Federal que tem esse relatório detalhadamente. As autoridades aqui presentes precisam ver o relatório levantado por antropólogos e biólogos.” Tribuna da Imprensa, 8/01/2014)

Neste  inicio de ano a atenção continua voltada para a Amazônia. Quando se fazia crer que ali a questão indígena estava pacificada, com a demarcação da maior parte das terras, na anti sala surge o agito: não retiraram os invasores, não esclareceram e compensaram pelo extermínio de milhares de indígenas pelas estradas, hidrelétricas e outros grandes projetos, não garantiram projetos satisfatórios nas questões básicas de  autonomia alimentar, escolas diferenciadas e de qualidade, atendimento à saúde, com respeito, eficiência e dignidade. Além disso, as mineradoras estão na fila de espera, forçando a porta, pois tem pressa para que possam começar o jogo nas terras indígenas, o ministro da AGU não revogou a portaria 303, e o governo se diz contra a PEC 2015, mas não mobilizou sua maioria para impedir a instalação da Comissão Especial desse projeto.
O cenário é, no mínimo preocupante. O Ministro Adams se projeta como o novo general Rangel Reis, ministro do Interior, na década de 70, cujo sonho era ver um Brasil sem índios. Para viabilizar seu projeto de país, arquitetou o maquiavélico projeto de emancipação dos índios, ou melhor dizendo, a extinção dos índios e a entrega das terras ao latifúndio. A portaria 303 que o ministro da AGU gestou, suspendeu mas teima em não extinguir, parece  renovar a intenção de Rangel Reis.E se juntássemos umas dezenas de projetos de lei e de emenda da constituição estaria formada a frente de um Brasil sem índios.
Em recentre entrevista o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro assim definiu a incapacidade da esquerda de entender a questão indígena “Foi preciso a esquerda, uma ex-guerrilheira, para realizar o projeto da direita. Na verdade, eles sempre quiseram a mesma coisa, que é mandar no povo. Direita e esquerda achavam que sabiam o que era melhor para o povo e, o que é pior, o que eles pensavam que fosse o melhor é muito parecido. ...O PT, a esquerda em geral, tem uma incapacidade congênita para pensar todo tipo de gente que não seja o bom operário que vai se transformar em consumidor. Uma incapacidade enorme para entender as populações que se recusaram a entrar no jogo do capitalismo. Quem não entrou no jogo – o índio, o seringueiro, o camponês, o quilombola –, gente que quer viver em paz, que quer ficar na dela, eles não entendem...(IHU, 9 de janeiro de 2014) Numa noite de outubro do ano passado, Viveiros de Castro criticava o avanço do governo de Dilma Rousseff sobre a Amazônia, seus projetos de estradas e usinas hidrelétricas, benefícios ao agronegócio – e descaso com os direitos dos povos indígenas. Sentado no sofá, o antropólogo comparou as ambições desenvolvimentistas da atual presidente à megalomania da ditadura, com seu ideário de “Brasil Grande”.
Pierre Clastres, antropólogo que esteve um bom tempo com povos indígenas no Brasil, escreveu o célebre livro “Sociedades Contra o Estado”, onde demonstra por que   povos indígenas  tomam a decisão coletiva de não ter Estado. Nele os chefes não mandam, não tem poder de coerção, deles é exigido uma maior generosidade, que o obriga a distribuir bens para o restante da sociedade.
Tenharim, Jiahui e Awá
Para entendermos um pouco dos acontecimentos nas terras desses povos em situação de isolamento, de pouco contato ou contato recente é preciso primeiro desconstruir em nós a mentalidade colonialista, preconceituosa e etnocêntrica, de superiores,  bandeirantes do progresso, heróis civilizadores.
É também fundamental compreendermos a dimensão de terra como  território, como um ser vivo, a mãe terra e com ela termos uma relação de respeito e não apenas de predadores ou produtores.
Precisamos dialogar sobre as situação plurinacional dos nossos países e a compreensão da autonomia e autodeterminação nas realidades de cada país e na legislação nacional e internacional.
É indispensável uma informação correta sobre os processos históricos dos contatos desses povos com o Estado e a sociedade nacional e as desastrosas consequências em termos de depopulação e sofrimento.
Neste início de ano estamos convidados a refletir sobre o nosso complexo país.

Egon Heck
Secretariado nacional do Cimi
Brasilia, 15 de janeiro de 2014





terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Território Awá Guajá – finalmente a desintrusão


“Cardozo explicou que essa ação de “desintrusão” vem sendo estudada há algum tempo, mas que era preciso passar a Copa das Confederações e a visita do Papa, que mobilizaram muitos efetivos.” ( O Globo 4/08/2013 – Mirian Leitão)
  


Além dos motivos alegados, certamente serão muitos outros os motivos da demora da execução da decisão da Justiça do Maranhão e do cumprimento da Constituição. Dentre  os motivos principais está a frontal oposição do agronegócio, que inclusive se manifestou contra a desintrusão por ocasião de suas manifestações em Brasília, dia 11 de dezembro passado.

Para a execução da ordem de desintrusão o governo montou uma coordenação integrada por vários ministérios e mais de uma dezena de órgãos do governo.

O Ministro da Justiça afirma que contam com a experiência de Marawaitsédé, terra Xavante desintrusada no ano de 2012
Lembra o Ministro da Justiça que “ é preciso entender que se fala terra indígena, mas pela lei brasileira a terra é da União. Portanto, proteger esses índios, expulsar os madeireiros e defender essa mata é do interesse dos brasileiros.”( O Globo- idem)

E não são poucos os interesses daqueles que não podem ver uma árvore em pé . Se calcula que  serão mais de 40 mil toras cortadas na mata dentro da terra indígena. Elas serão inutilizadas, promete o governo.

Desintrusão e omissão

“O povo mais ameaçado do planeta”,  como são considerados os Awá Guajá, numa campanha da Survival Internacional, parece estar próximo de ver-se livre dessa grave ameaça de genocídio. A desintrusão deve ter começado hoje. Os frequentes adiamentos e omissão tem agravado muito essa operação e as previsíveis resistências, especialmente do poder econômico e políticos.

É importante lembrar que situações como essa, assim como a gravíssima realidade do Mato Grosso do Sul, se agravam a cada dia que se passa.
Os Awá, que também são do tronco linguístico Tupi-Guarani, foram visitar seus parentes Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul, especialmente os acampamentos na beira das estradas. Nessa ocasião entregaram flechas, que estavam tão subjugados pelos brancos, porque tinham poucas flechas.


O país tem pressa. A bola vai rolar e as eleições estão na porta. Essas manchas na imagem da nação não podem se perpetuar.

Em 1978, quando o Estatuo do Índio previa a demarcação de todas as terras indígenas, diante  da total inoperância e omissão do Estado brasileiro, os povos indígenas Kaingang  e Guarani do Sul  do país, enfrentaram os invasores, os políticos, a polícia, a Funai e eles mesmos colocaram  mais de 10 mil famílias de brancos para fora de suas terras. Foram ações heroicas, corajosas, destemidas. Em Nonoai- RS, por exemplo um pouco mais de mil índios colocaram para fora de sua terra mais de dez mil pessoas que haviam se estabelecido nas terras indígenas, ou mesmo sendo aliciados ou estimulados pelo modelo político a invadirem essas sagradas terras indígenas. Das famílias que se estabeleceram à beira da estrada, originou-se o movimento dos Sem Terra. O governo queria deportar as famílias para a Amazônia.




Conquista e resistência

Depois das intensas mobilizações indígenas por ocasião da Constituinte e conquista de seus direitos na Constituição, em 1988,  só em 2013 os povos indígenas tiveram uma mobilização tão intensa. Desta vez foi para evitarem que seus direitos fossem retirados da Constituição. Uma avalanche de ações contra os direitos indígenas, foram arremessadas como flechas incendiarias, especialmente do poder legislativo e do governo. Essa conjuntura explosiva e genocida só não  se baniu os direitos indígenas e rasgou a constituição graças à intensa e permanente mobilização indígena, desde as aldeias ate o Palácio do Planalto e o Congresso nacional.

Os cenários são de que esses embates continuem nesse ano. Porém tem a Copa do mundo e as eleições, que serão prioridade número um para o país.

Egon Heck
Secretariado nacional do Cimi
Brasília, 6 de janeiro de 2014






sábado, 4 de janeiro de 2014

As estradas e os índios




Numa  matéria de julho de 1975 Eliane Castanheda afirma “Nada tem sido mais dramático para a sobrevivência das tribos indígenas brasileiras  que a construção de estradas em seus territórios. Pela estrada vem o branco, o vírus das doenças, os germes da mendicância, da violência, da prostituição...”(Veja 18/07/1975)

As recentes violências em Humaitá-AM, tocam numa das feridas das veias e vias abertas na Ditadura  militar no Brasil. Ao ordenarem, em sua estratégia geopolítica e econômica, que se rasgasse a densa floresta amazônica em todas as direções, não apenas se estava abrindo estradas de invasão (chamado de vias da integração, do desenvolvimento, do deslocamento do nordeste da seca para a Amazônia sem gente!) mas caminhos do genocídios de inúmeros povos e comunidade indígenas que estavam sob os traçados das estradas. E foi nesta política, que o território Tenharim foi  rasgado pela Transamazônica, BR 230, na década de 70.
“Para Schwade, a investigação da Comissão Nacional da Verdade sobre a violência sofrida por índios terá que apontar o que ocorreu com os Cinta Larga e Suruí, na região dos rios Aripuanã e Rooswelt, entre Rondônia e Mato Grosso; os Krenhakarore do rio Peixoto de Azevedo, na rodovia Cuiabá-Santarém (conhecidos como Índios Gigantes); os Kanê ou Beiços-de-Pau do Rio Arinos no Mato Grosso; os Avá-Canoeiro em Goiás; Parakanã e Arara no Pará, entre outros, em função dos projetos políticos e econômicos da Ditadura.”

 Construção de rodovias no governo militar matou cerca de 8 mil índios
Por Luciana Lima , iG Brasília | 25/09/2013 06:00

 “As investigações da Comissão Nacional da Verdade (CNV) pela região Amazônica indicam um verdadeiro genocídio de índios durante o período da ditadura militar. Não há como falar em um número exato de mortos devido à falta de registros. Os relatos colhidos, no entanto, apontam que cerca de oito mil índios foram exterminados em pelo menos quatro frentes de construção de estradas no meio da mata, projetos tocados com prioridade pelos governos militares na década de 1970.” (IG, 25/09/2013)
O referido texto , que além de denunciar o massacre de mais de 2 mil Waimiri Atroari pela construção da BR 174 – Manaus-AM –Bos Vista-RR se refere especificamente   às trágicas consequência da construção da Transamazônica parra os povos indígenas. “A Transamazônica foi escolhida como prioridade e, por isso, representou uma verdadeira tragédia para 29 grupos indígenas, dentre eles, 11 etnias que viviam completamente isoladas. Documentos em poder da Comissão da Verdade apontam, por exemplo, o extermínio quase que total dos índios Jiahui e de boa parte dos Tenharim. O território dessas duas etnias está localizado no sul do Estado do Amazonas, no município de Humaitá”.

 Essa é a hora da verdade. A Comissão Nacional da Verdade , juntamente com a Comissão Indígena da Verdade e Justiça deverão, com urgência fazer um detalhado documentário sobre as graves consequências da violência e mortes acarretadas a esse povo pela estrada. Registrar  o genocídio que acarretou a construção da Transamazônica, o que ela significou para dezenas de povos, dentre eles os Tenharim. É o momento do povo brasileiro conhecer melhor a verdadeira história dos massacres e não ser mais uma vez jogada contra os índios,  estimulando o ódio e o preconceito.

Os povos indígenas,  maiores vítimas desse modelo desenvolvimentista, tem denunciado reiteradas vezes essas tragédias, dos índios e as estradas. Entidades como o Cimi, vem a quatro décadas  denunciando as consequências dessas rodovias da morte para comunidades e povos indígenas.

A continuidade desse modelo de progresso a qualquer preço, do qual mais uma vez os povos indígenas são as maiores vítimas, fica evidenciado nos grandes projetos como as hidrelétricas de Belo Monte, no Xingu e as planejadas para o Rio Tapajós, dentre outros.

O que a violência de Humaitá revela

A violência que significa uma estrada que passa por um território indígena. Os Tenharim sentiram o golpe que significou a transamazônica  atravessando seu território, abrindo-o para a invasão de interesses  econômicos, principalmente madeireiras e mineradoras e garimpo.  São mais de três décadas  de permanentes  agressões aos índios e ao seu território.

Margarida Tenharim denunciou à Comissão Nacional da Verdade as centenas de indígenas mortos por ocasião e em consequência da estrada.. Eu vi, diz ela, as mortes de adultos, jovens e crianças...foram muitos. Passaram por cima de nossos cemitérios...Estão querendo guerrear de novo, mas nós vamos lutar pelos nossos direitos. Outra liderança fala da dependência que veio a partir da estrada e mostrar o preconceito e animosidade que persiste “ainda hoje tratam nois como bicho”.

Essa situação revela a urgência de se estabelecer normas definitivas, superando a política colonialista e integracionista, aprovando o Estatuto dos Povos Indígenas e o Conselho Nacional de Política Indigenista.
Veja no sítio abaixo:

Egon Heck
Cimi, secretariado
Brasília, 3 de janeiro de 2014



segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

A raiz das ruas

 
Ao me debruçar sobre a memória dos acontecimentos de 2013 imediatamente emergem duas imagens fortes, a súbita ocupação do plenário da Câmara dos Deputados, pelos povos indígenas de todo o país, em abril, e na sequencia a massiva ocupação das ruas por milhares e milhões de brasileiros de todas as idades e origens, neste imenso Brasil.  Poderíamos nos perguntar, o que tem a ver algumas centenas de nativos ocuparem física e simbolicamente o inviolável e sagrado ambiente do poder legislativo?  A debandada de deputados é a melhor imagem  do secular preconceito e etnocídio praticado pelas classes dominantes encasteladas nos três poderes e dos imperadores de aquém e além  mar.
Não demorou e o grito de insatisfação eclodiu nas ruas.  Um rotundo não a tudo que aí está em termos de modelo político, econômico e social. Do sistema  de exclusão e marginalização ao capenga modelo de democracia representativa. Questionou-se tudo. A insatisfação e indignação transbordaram para as ruas em forma de tsunami. As ruas foram o desaguadouro.   Sem um projeto pronto de sociedade, mas a necessidade de varrer a corrupção e construir algo de novo, a partir de uma nova consciência. Imperativo urgente de transformações profundas da insurgência das aldeias e das ruas veio o  recado -  um país sem mensalão ou mensalinho, sem  racismo, exclusão ou preconceito. Um Brasil plural, outro caminho.
Mobilizando a resistência e a insurgência
Talvez  mais que qualquer outro setor social os povos indígenas tiveram que se manter em permanente estado de alerta e mobilização para não verem seus direitos retalhados e rasgados, suprimidos  da Constituição.  Iniciativas partidas dos três poderes. Nítida impressão de que as forças anti indígenas estavam orquestradas na sórdida e cínica sanha de sequestrar os direitos indígenas e entregar as terras indígenas à rapinagem. Para os ruralistas e o agronegócio tudo é valido desde que não se questione ou coloque qualquer obstáculo à vaca sagrada da propriedade privada e da acumulação através da empesteada produção  da monomulta
Jesus  Guarani em Yvy Katu
Renascimento da luta pelo território tradicional, esperança e um sonho renovado da paz distante, na guerra presente. Nas crianças o sorriso, apesar de tudo. Nos guerreiros e sábios a certeza da vitória na incerteza das batalhas que terão pela frente. Nas diversas manifestações públicas às autoridades e à sociedade, não deixam lugar para dúvidas: mais dia, menos dia a vitória da terra virá. Não virá no sorriso forçado de algum papai Noel, mas no vermelho do sangue já derramado e que não foi e será em vão. Irão, se necessário for, até as últimas consequências – a morte coletiva.
Nos barracos e acampamentos tem lugar para Jesus de Nazaré , de Yvy Katu, Guarani Nhandeva, mensageiro de esperança e força transformadora.
Aos que partiram para ficar entre nós
A imagem sorridente nos enche de seu espírito revolucionário e de Justiça. Nelson Mandela, o grande lutador por um outro mundo possível, a partir de seu exemplo de luta em sua pátria e pelo planeta afora. Ele, como tantos  outros que partiram, são indispensáveis e permanecerão por todo sempre em nossas memórias. Serão a luz em nossa frente aquecendo nosso espírito para não perder o horizonte e não se deixar abater pelas pedras do caminho.
Quero deixar minha admiração e gratidão ao exemplo insofismável dos guerreiros Kaiowá Guarani e Terena do Mato Grosso do Sul que tombaram sob as balas assassinas dos pistoleiros, fazendeiros e daqueles que os deviam defender, a polícia.
Além dessas figuras maravilhosas que sempre nos inspirarão, quero registrar a figura de um sábio guerreiro, que ajudou forjar minha resistência e rebeldia, através de uma sólida consciência social e insubmissão.  Refiro-me ao Pe. Adair Mario Tedesco, que nos idos dos anos cinquenta e sessenta acompanhou meus passos, partilhou sabedoria e saberes, alegrou meus dias com canções as mais diversas e jogou  no meio de campo no time de futebol do seminário.
Grande Tedesco, guerreiro da sabedoria e testemunho na fé, partiste há poucos dias. Estava distante e não pude estar em sua despedida, mas o faço agora com toda admiração que mereces, na certeza de que novamente estamos mais próximos, na causa, no campo na luta
Que o ano de 2014, não seja apenas de  belas jogadas no campo e nas urnas, mas que faça brotar em cada um de nós um melhor lutador nas arenas da justiça e liberdade. Vamos estar juntos nas ruas, nos campos, nas urnas.Vamos fazer avançar a esperança e a transformação e construção de um novo projeto para o Brasil. Não poderia deixar de encerrar mais um ano sem minha  gratidão a todos os guerreiros indígenas e do Cimi
Egon Heck e Laila Menezes
Povo Guarani Grande Povo
Cimi, Brasilia, 25 de dezembro de 2013




sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

YVY Katu – terra, vida e morte


Sentei para escrever um texto sobre os acontecimentos que fervilharam no centro do poder. Seria possivelmente um escrito indignado, irado,  com suspiros de esperança na luta pelos direitos humanos.
Ao me deparar com a carta de Yvy Katu uma incontida emoção eclodiu. Lembrei-me dos inúmeros momentos da participação em rituais, rodas de conversa, ou na agradável companhia no rancho de Rosalino e Lourença ou ainda nas Aty Guasu ali realizadas, carregadas de tensão e esperança. Em todos esses momentos o assunto central das conversas sempre girava em torno da luta pela terra e seus desdobramentos. Afinal de contas faziam dez anos que o governo federal reconhecia a terra indígena e nada acontecia em termos de solução da questão da liberação das terras para os Guarani.
Diante de mais esse grito , quase desesperado, dos Guarani, não é possível ficar parado e calado. De imediato  me dispus a ajudar a dar visibilidade e entrar em sintonia com a alma Guarani, se manifestando em rituais profundos, de despedida ” , começamos a realizar um raro ritual religioso nosso de despedida da vida da terra, essa é a nossa crença, um ato consciente de preparação da vida para a morte forçada pelas armas de fogo dos homens brancos, ou melhor, começamos a participar da cerimônia de aceitação e confirmação da saída forçada da alma do corpo e sua volta ao cosmo Guarani em função da morte forçada no campo da luta”. Com certeza o grande page (Nhanderu) líder religioso e lutador de seu povo Delosanto Centurion, que á poucos anos partiu, estar, juntamente com o espírito dos guerreiros, estarão inspirando seu povo em mais um momento tão decisivo. Junto-me a todos , nessa encruzilhada crucial. É preciso muita reza e luta.
Diante da decisão de expulsão a decisão da Comunidade
 Diante da 5 decisão de reintegração de posse declaram “assim, claramente a justiça brasileira vai matar todos nós Guarani e Kaiowá. Mais uma ordem de despejo da Justiça Federal deixa evidente para nós que a Justiça do Brasil está autorizando o extermínio Guarani e Kaiowá, as violências, morte coletiva, sobretudo extinção e dizimação Guarani e Kaiowá do Brasil “. Diante da surdez e omissão do Estado brasileiro  declaram ”Avisamos também que não vamos sair mais de nossa terra YVY KATU, aqui morreremos todos juntos, aqui queremos ser enterrados todos. Essa é a nossa decisão definitiva que não mudamos nossa decisão. Já enviamos e reenviamos várias vezes ao Governo Federal e ao Ministro da Justiça, à Presidenta Dilma, ao Ministério Público Federal, ao Presidente do Supremo Tribunal Federal”. Com a decisão de resistir e lutar até a morte. E  solicitam “pedimos ao Governo Dilma e Presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa para mandar somente enterrar coletivamente todos nós aqui no tekoha YVY KATU. Nem vivos e nem morto iremos sair daqui de nossa terra antiga. Com vida ainda, antecipamos os nossos pedimos à Justiça, esse nosso direito de ser sepultado ou enterrado aqui no YVY KATU, esse pedido exigimos à Justiça do Brasil.” Pedem ainda à presidente Dilma e Justiça Federal, que decretou a expulsão e a morte coletiva para amparar as crianças, mulheres e idosos sobreviventes. Anunciam que estarão a  partir de 12 deste mês em “ritual religioso de despedida da vida e da terra” Terminam a carta  reafirmando sua decisão de resistir ao despejo “e seremos mortos pela arma de fogo dos homens brancos ou policiais.”  Convocam a sociedade nacional e internacional para acompanhar e assistir ao genocídio.
Na atividade da Comissão Indígena da Verdade e Justiça,  no Fórum Mundial de Direitos Humanos, a liderança de Yvy Katu, Valdomiro Ortiz, em seu depoimento ressaltou a gravidade do momento  para os Kaiowá Guarani e os Terena no Mato Grosso do sul e em especial a sua terra indígena Yvy Katu. Alerta semelhante foi feita pela liderança Kaiowá Guarani Tonico Benites.
Egon Heck
Povo Guarani Grande Povo

Cimi, Brasilia 13 de dezembro de 2013

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Adeus Terras Indígenas


Mais um decreto de extermínio. Aliás uma minuta carimbada pelo Ministro da Justiça, com tonalidades do Ministro Adams,da AGU, em sintonia com os ruralistas e o que de mais reacionário existe nas elites civis e militares brasileiras.

Quando , em agosto de 1996 o então ministro da Justiça Nelson Jobim, a título de “agilizar e democratizar”  os procedimentos de regularização das terras indígenas, editou a portaria 1775 houve um grito geral dos povos indígenas e seus aliados. Seria o começo do fim da demarcação das terras indígenas, além de ter aspectos nitidamente inconstitucionais. Mobilizações indígenas se deram em todo o país, exigindo a revogação.  A pressão do movimento indígena e setores da sociedade, fez com que a desgraça não fosse pior. O primeiro a descumprir a portaria, nos prazos estabelecidos foi o próprio governo. Mesmo assim alguns processos de demarcação avançaram. Foi então que o agronegócio entrou em campo para exigir a paralisação total do reconhecimento das terras indígenas. Consideram  a portaria 1775/96 inconstitucional e pediram sua revogação além de pedir a extinção da FUNAI.

Com os governos Lula e Dilma se imaginava que a situação não poderia piorar. Aliás Lula, logo no início de seu mandato, prometeu a demarcação de todas as terras indígenas até o final  de seu primeiro mandato.  O que evidentemente não aconteceu até o final do segundo mandato. Reconheceu que o Estado brasileiro continuava com uma enorme dívida histórica para com os povos indígenas. Passou a dívida a Dilma. No final do terceiro ano, tendo no horizonte a Copa do mundo, as eleições,  decidiu aumentar e arrolar a dívida com os povos originários, especialmente no que diz respeito à demarcação e garantia das terras indígenas. A proposta de minuta do Ministério da Justiça nada mais é do que o cínico lavar as mãos acatando as genocidas propostas do agronegócio. Algo  maquiavélico.

E a terra vermelha o levou

Ambrosio Kaiowa  acaba de ser enterrado, na terra reconquistada de Guyraroka. Parte com as lutas, contradições, revoltas e iras de seu tempo. Sua luta de retomada da terra contrariou grandes interesses multinacionais e de políticos. Estava cercado de cana, sofrendo com o envenenamento da terra e das águas. Fez inúmeras denúncias em tom enfático. Participou do movimento  de luta Kaiowá Guarani, chegando a ser escolhido para o Conselho da Aty Guasu.Confinado, com sua comunidade em 60 há, do total de 12 mil ha definidos por portaria declaratória como terra indígena,  conviveu com muitas dificuldades, tensões e conflitos internos, nos últimos tempos. Se tivessem seu território livre certamente a realidade seria diferente e o desfecho de sua vida, outro.

Ambrosio teve projeção nacional e internacional pela sua expressiva atuação do Filme “
Terra Vermelha”, inspirado na luta do processo de retomada da terra, e que procurou retratar esse aspecto crucial para todos os Kaiowá Guarani, que é a privação de suas terras. Esse fato certamente teve conseqüências de não fácil dimensionamento.

Guyraroká foi uma das comunidades visitadas por inúmeras delegações, dentre elas a diretoria do Cimi e o então Secretário da CCNBB, D. Dimas, hoje arcebispo de Campo Grande.
Nesta ocasião também recebeu a importante visita de indios Axá Guajá do Maranhão, que lhe entregaram um pacote de flechas.
Na sua aldeia estava previsto a realização de Encontro Continental Guarani, porém o encontro foi vetado pelo governador do Estado, vindo a se realizar meses.
 depois em Anhetetê, no Paraná. Porem ficou a “Oga Guasu” grande casa de reza”, cuja construção foi coordenada por ele

Ambrósio foi uma dessas lideranças  que marcou a luta desse povo por seus direitos, não se livrando das contradições inerentes à sua personalidade e vítima de toda a estrutura de racismo e ódio que envolve a questão indígena no Mato Grosso do Sul.

Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

Brasília 3 de dezembro de 2013


terça-feira, 26 de novembro de 2013

Dia de Marçal, dia de luta Guarani Kaiowá

 O grito guerreiro, do fundo da terra, da floresta ou da raiz continuará anunciando um novo amanhecer. Não podem matar nosso sonho. “Somos lutadores resistentes de uma causa invencível,somos não apenas sobreviventes de uma guerra secular, mas portadores de sabedoria para novas sociedades. Semelhante grito continua a ressoar mundo  afora.
Lembrar a memória de um guerreiro que tombou na luta pela terra, pelos direitos de seu povo é sempre um momento de  fortalecer a resistência e convocar  todas as forças e energias para a conquista definitiva dos direitos, especialmente seus territórios tradicionais.
Apesar das circunstâncias bastante ameaçadoras, os Kaiowá Guarani não se deixaram intimidar e foram celebrar honrar a memória de Tupã’i na terra indígena Nhanderu Marangatu, onde há  30 anos ele foi assassinado.

Situação vergonhosa

Em carta que fizeram chegar à presidente Dilma, jovens e adolescentes Kaiowa e Guarani que estiveram em Brasília, lembram mais uma vez que a gravíssima situação em que se encontram nos acampamentos, retomadas, confinamentos afirmam:  “é a falta de terras demarcadas, para que possamos recuperar plenamente nossa autonomia e nosso teko porá as boas praticas ensinadas pelos nossos ancestrais...”
Já nesta semana  foi encaminhada à  presidente Dilma carta por organização indígenas, dentre as quais a Aty Guasu Kaiowá Guarani e entidades indigenistas exigindo “uma intervenção federal imediata no Mato Grosso do Sul, de modo a evitar mais uma tragédia anunciada no Brasil”. Concluem afirmando que “O poder público pode e deve evitar esta "tragédia anunciada”, repetição sistemática do genocídio contra os povos indígenas. E isto precisa ser feito agora. O reconhecimento e a demarcação das terras indígenas é a verdadeira solução para a situação que está posta no Mato Grosso do Sul.”
Os fazendeiros, por sua vez estão a todo vapor, preparando o leilão vergonhoso, que ousam chamar   “da resistência”. Em tom ameaçador, como quem está acima da lei,  propalam a data limite para a solução do problema das terras indígenas, final de novembro, ou seja, daqui uma semana. Não é preciso ser nenhum futurólogo para  prever que o governo não resolverá essa situação até a data estipulada. E o que acontecerá então?  De quem será a responsabilidade das tragédias anunciadas?
Enquanto isso o governador Puccineli continua sua cruzada e catilinária contra o Cimi, acusando-o de ser “o braço facista da CNBB” ( Site do Cimi), em afirmações eivadas de  preconceito e ódio. Há que se perguntar quem é o braço fascista do agronegócio.

“Yvy Katu – nenhum palmo atrás”

Essa decisão de mais de cinco mil Guarani Nhandeva dessa terra indígena, demonstra a disposição, mesmo em circunstâncias extremamente desiguais,  de viver e lutar pelo seu território.   As ordens de despejo vão aumentando,  o que deixa  antever a proporção dos conflitos.
O Ministério Público Federal de Dourados está empenhado em mediar uma conversação com a participação da justiça e das partes envolvidas, buscando um acordo possível para evitar mais ameaças e violência. Enquanto isso aguarda uma posição firme do governo federal  assumindo a responsabilidade do Estado brasileiro que doou os títulos da terra na colônia federal de Iguatemi. Sem essa indenização dificilmente haverá uma saída justa dos direitos indígenas à suas terras tradicionais.
Egon Heck
Povo Guarani, Grande Povo

 Cimi –  Brasilia, 25 de novembro de 201