ATL 2017

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segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Respeitem a Constituição


Mobilização indígena nacional

 “Nos respeitem. Respeitem nossos direitos. Não continuem rasgando a Constituição.”  Uma semana de intensa mobilização dos povos indígenas que ocupam Brasília há quase uma semana. O enterro "simbólico" com rituais verdadeiros de proeminentes inimigos como  Kátia Abreu, Ronaldo Caiado, Gleise Hofmann e Luiz Adams,  e a ocupação da Confederação Nacional da Agricultura-CNA são demonstrações inequívocas de uma luta sem tréguas na defesa de seus direitos.
  
O chão tremeu com o pisar forte e ritmado dos cantos de guerra, e dos gritos repetidos de fora Katia Abreu. Após o susto inicial, os poucos funcionários se transformaram em plateia silenciosa e curiosa. Os indígenas permaneceram dentro da sede por mais de uma hora em rituais, demonstração de união, indignação e gritos. Sem vandalismo ou violência deram seu recado radical:
Fica uma pergunta sem resposta porque o presidente do congresso esvaziou a casa em plena semana de comemoração das bodas de prata da carta magma? Reza o ditado popular: Quem não deve, não teme. Então porque "fugiram" senhores parlamentares deixando o congresso vazio, desmarcando todas as sessões?. Afinal a sociedade pode constatar que  os povos indígenas apenas  lutam para que se compra a constituição, não são canibais,baderneiros ou cidadãos de segunda categoria. Pelo contrário, talvez tenham sido os brasileiros de raiz que mais defenderam a Constituição.
 



Na véspera da comemoração dos 25 anos da Constituição, os povos indígenas, expressaram sua indignação, exigências e esperanças: “repudiamos de público os ataques orquestrados pelo governo da presidente Dilma Roussef e parlamentares majoritariamente ruralistas do Congresso Nacional, contra nossos direitos originários e fundamentais, principalmente os direitos sagrados à terra,territórios e bens naturais garantidos pela Constituição Federal de 1988”. Reafirmam “Diante dessa realidade, de forma unânime, de uma só voz, declaramos e exigimos do Estado brasileiro, inclusive do poder judiciário, que respeite os nossos direitos, que valorize a diversidade e pluralidade da sociedade brasileira. Reafirmamos que vamos resistir, inclusive arriscando nossas vidas, contra quaisquer ameaças, medidas e planos que violem nossos direitos e busquem nos extinguir, por meio da invasão, destruição e ocupação de nossos territórios e bens naturais, para fins desenvolvimentistas e de interesse de uns poucos”.  Por fim exigem o arquivamento imediato e definitivo de todas as iniciativas que afrontam seus direitos e a retomada imediata da demarcação de todas as terras indígenas. ( declaração em defesa da Constituição Federal, dos Direitos Constitucionais indígenas, quilombolas de outras populações e da mãe natureza)

A volta vitoriosa

Brasília se enfeitou de verde para acolher os povos indígenas, no espaço da esplanada dos ministérios, que já se transformou em patrimônio de luta dos povos originários desse país, na luta pelos seus direitos.

Recado dado, é hora de voltar para as aldeias, onde a vida e luta continuam. Deixaram a capital federal satisfeitos com as mobilizações realizadas numa semana intensa, mas que não tirou o ânimo de quem veio para mais uma batalha por seus direitos ameaçados e desrespeitados. Vieram para defender e exigir respeito à Carta Magna do país, que eles ajudaram a construir há 25 anos e que em grande parte continua sendo desrespeitada por aqueles mesmos que deveriam ser os primeiros a cumpri-la. Mas também voltam preocupados, pois sentem a má vontade e malvadeza que acontece nos três poderes, ameaçando e violando os direitos indígenas.

Em suas bagagens levam, além das armas que sustentam suas esperanças, arcos, flechas, bordunas, inúmeras lembranças das mobilizações, registros das falas indignadas, dos momentos de tensão e repressão, das centenas de militares postados à sua frente para impedir que pudessem entrar na casa do povo. Levam também a certeza de que voltam às suas terras mais unidos e articulados e com um apoio muito maior da sociedade brasileira, que não apenas viu e vibrou com as manifestações, mas que vai também cobrar o respeito aos direitos e consolidação de um país Plurinacional, respeitador de sua gente raiz, originária.

Egon Heck e Laila Menezes
Povo Guarani Grande Povo
Brasilia, 6 de outubro de 2013


Repórter de uma guerra secular


 

Mobilização Indígena em Brasília

 

Em frente ao Congresso centenas de policiais estão apostos e dispostos a reagir a qualquer tentativa de entrada na “casa do povo”. Do outro lado da trincheira verde centenas de indígenas de todo o país decididos a visitar a sua casa e entregar um documento com suas exigências e reivindicações. Quando os indígenas se aproximam, recebem uma rajada de pray de pimenta nos olhos. Correm com a forte ardência dos olhos.Revoltados pelo ato covarde dos “recepcionistas” com suas armas modernas de uma guerra secular, insistem em sua intenção de entrar no Congresso, covardemente abandonado, com as atividades suspensas. Seguem-se momentos de tensão e expectativa. Os Kayapó e Xavantes fazem seus rituais de guerra e com seus arcos, flechas e bordunas avançam em direção aos policiais. Centenas de guerreiros de inúmeros povos se posicionam frente ao Congresso ao qual pretendiam entrar para  um ato de protesto, num diálogo impossível, de uma casa donde partem iniciativas mortais contra seus povos e diretos.

 
É apenas mais um capítulo de uma guerra secular. Mudam as armas e os atores, mas o processo de invasão, violência, saque e extermínio genocida continuam. Infelizmente, nessas últimas décadas, tenho sido mais uma espécie de repórter, testemunho e indignado registrador das violências que o projeto colonizador impetra contra os povos originários dessa terra.

 
A guerra se sofisticou.  Colocaram-se silenciadores nas armas pesadas, aprovadas na calada da noite, nas formas de projetos de lei, portarias, projetos de emendas constitucionais e  todo um arsenal de artilharia acionada contra os direitos constitucionais indígenas

 
Simbolicamente, na tarde desse dia 2 de outubro, Brasília se transformou no palco de mais uma batalha contra os direitos dos povos indígenas. Impedidos de entrar no Congresso, os indígenas manifestaram sua indignação fechando os acesso aos três poderes e circulando por esses espaços, fortemente ocupados por tropas policiais.

 Mulheres Pataxó, de Coroa Vermelha, revoltadas com a ação dos policiais que atiraram spray de pimenta em seus olhos,  chorando xingavam os responsáveis pela atualização da violência desses 513 anos, desde que Cabral iniciou a invasão de seu território.

 
Solidariedade e apoio

 
Foi um dia marcante para os mais de mil indígenas de uma centena de povos de todo o país. Foi o momento de deixar as cores da lona de circo e circular nos espaços dos três poderes, em lindos e coloridos rituais e indignadas manifestações e exigências.

 
Mas foi também um dia em que receberam importante solidariedade da Central Única dos Trabalhadores – CUT , “Declaramos todo apoio à semana de mobilização em defesa dos direitos indígenas, presentes na Constituição Federal...”. O  sindicato dos servidores públicos no distrito federal – SINDSEP-DF “vem a público apoiar a convocação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil para as manifestações em defesa dos direitos indígenas presentes na Constituição Federal de 1988...Nós enquanto representantes dos servidores públicos não podemos estar ausentes dessa luta, pois o que está em jogo é a soberania nacional”. Também receberam importante apoio da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, onde participaram de um debate e de uma centena de deputados aliados que vieram até o acampamento trazer seu apoio e solidariedade.

 
A mobilização e luta dos povos indígenas em todo o Brasil e particularmente em Brasília a cada dia que passam vem recebendo apoio da sociedade brasileira e internacional, “pois essa é uma luta pela vida dos povos, da natureza, do planeta terra”.

 

Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

Cimi, Brasília, 3 de outubro de 2013


A volta dos guerreiros - 25 anos depois da Constituinte


Quem imaginaria que 25 anos depois daquela  difícil mas gloriosa vitória dos povos indígenas e setores progressistas da sociedade,na Constituição com avanços significativos  e conquista de direitos sociais,  teríamos um quadro de mobilizações para impedir retrocessos. Sonhávamos com um cenário bem diferente:  os direitos conquistados consolidados, rumo à construção de uma sociedade mais justa, na pluralidade de seus povos e culturas,  democracia participativa e  comunitária,não apenas representativa, formal e injusta.

Os guerreiros  indígenas voltam à cena, ao espaço do poder, no planalto central.  Vem  exigir que não  retirem  seus direitos  da Constituição.  Senhores do  poder, cumpram a Constituição e não a rasguem, não desonrem o país,  não manchem a imagem da nação. Nossos direitos são sagrados e sob nenhuma hipótese podem ser violados.

O espartano grito de guerra e paz dos Kayapó e centenas de povos indígenas,  encheram o espaço do Centro de Formação Vicente Cañas, onde se reuniram mais de mil indígenas que, na madrugada do início de outubro, acamparam na esplanada dos ministérios para fazer ouvir o seu grito, nacional e mundialmente. A chuva fina não tirou o ânimo dos guerreiros que em pouco tempo construíram a grande aldeia plural no coração do poder, no planalto central.

Conquistas e retrocessos

Quando, há 25 anos, Ulisses Guimarães, presidente do Congresso Constituinte, declarava aprovada a nova Constituição, consagrava uma carta Magna, na qual, pela primeira vez os povos indígenas conquistaram importantes direitos sobre seus territórios e recursos naturais e na sua relação autônoma com relação ao Estado e a sociedade brasileira.

Porém  os povos indígenas não alimentavam ilusões quanto às enormes dificuldades que teriam pela frente, para fazer os direitos saírem do papel e se tornarem realidade. Não tinham dúvidas de que as elites políticas, econômicas e militares de tudo fariam para inviabilizar esses direitos. E assim aconteceu. Prova disto é que cinco anos após a aprovação da Constituição, quando todas as terras indígenas deveriam estar demarcadas, parlamentares e setores anti indígenas desencadearam uma intensa campanha de “revisão da Constituição. Na prática significada retirar direitos sociais dos índios, quilombolas e outros setores sociais. Apesar de não terem conseguido seus intentos em 1993, não desistiram de suas intenções retrógrados e genocidas.

Se não conseguiram retirar os direitos indígenas na Constituição,  conseguiram inviabilizar a efetivação desses direitos, na prática. As maior prova disso é que mais de 80% das terras indígenas, ou sequer foram demarcadas ou tem alguma forma de invasão. Além disso, o Estatuto dos Povos Indígenas, que seria fundamental para implementar e explicitar a efetivação dos direitos, até hoje não foi aprovado. O mesmo acontece com o Conselho Nacional de Política Indigenista, que poderia ser instrumento de superação da pratica colonialista  do Estado brasileiro com relação aos 305 povos indígenas no país, até hoje continua emperrado no Congresso.

A guerra secular continua. Mudam as garras, mas permanece o preconceito, os esbulho, ódio, o racismo o etnocídio e o genocídio. Até quando?
Os povos indígenas em   Brasília e em todo o país estão se mobilizando para defender seus direitos constitucionais, consuetudinários, originários e sagrados, a seus territórios e seus projetos de vida e autonomia.

 Protagonismo indígena

Após as grandes Assembleias Indígenas, da década de 70, as grandes mobilizações  da década de 80, a Marcha e Conferência Indígena de Coroa Vermelha, no ano 2000, os Acampamentos Terra Livre,  os povos indígenas no Brasil estão construindo um  importante protagonismo dentro do cenário de transformações sociais no país e no continente. E hoje somam forças aos quilombolas, professores, acadêmicos universitários e  numa sociedade civil, mais informada dos direitos destes povos.

Estão se mobilizando para impedir que se continue rasgando a Constituição, massacrando os povos originários, tripudiando sobre a legislação nacional e internacional que assegura os direitos e a diversidade étnica, cultural e societária no Brasil.

O  movimento indígena, nesses 25 anos avançou e consolidou um amplo e permanente espaço de luta e afirmação de seus projetos de vida e de futuro, construindo e ampliando as alianças com os demais setores oprimidos, explorados  e excluídos da sociedade. O movimento indígena tem construído seu protagonismo na resistência e nas lutas pelos seus direitos dentro dos amplos processos de transformações sociais e construção de novos modelos de Estado e sociedade, na pluralidade de povos e culturas, com justiça social e democracia participativa e comunitária.

Os povos indígenas estão em mobilização, na avenida Paulista, nos fechamentos de estradas, nas retomadas de seus territórios originários, nos espaços dos três poderes em Brasília.

Egon Heck

Povos Indígenas do Brasil em mobilização

Brasila, 2 de outubro de 2013

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sábado, 31 de agosto de 2013

Retrocesso na mesa de negociação (Povos Indígenas do Mato Grosso do Sul )


Em sua quinta reunião, a mesa de negociação tão decantada pelo Ministro da Justiça, transformou-se numa mesa de decepção e retrocesso.

Os representantes do governo do Estado do Mato Grosso do Sul, foram logo deixando claro a mudança de posição com relação à Terra Indígena de Buriti. "Não existe mais terra a ser comprada com os Títulos da Dívida Agrária. Portanto  nada feito com relação aos 16 mil hectares que seriam comprados pelo governo federal e pagos pelo governo estadual".

 

"Isso mostra claramente que não existe interesse por parte do estado em resolver o problema." Uma das presentes, que não é membro da Comissão, teria logo acrescentando "temos que ir para o plano B". Ou seja, o único caso que parecia estar resolvido, retrocedeu e na próxima reunião, daqui há 15 dias, a assessoria jurídica terá que apresentar outra alternativa. Outros prazos e propostas postergarão indefinidamente qualquer solução efetiva. "Tudo voltou à estaca zero" afirmaram as lideranças participantes

Levantamentos feitos pelo juiz Odilon de Oliveira apontam mais de 300 mil hectares  de terra no Mato Grosso do sul em poder do narco-tráfico. Existem tamaabém terras públicas da União... O que na verdade precisaria ser feito é um levantamento fundiário das terras no Estado, que pudesse servir de base das terras disponíveis que poderiam ajudar as soluções para garantir as terras indígenas neste Estado

 Como há 513 anos

A maior surpresa da reunião foi a presença de três pessoas de uma mesma família trazendo consigo três lideranças Kaiowá Guarani. Ficou evidente que a velha estratégia de dividir o povo, para provocar conflitos internos, estratégia dos invasores há mais de cinco séculos, continua sendo utilizada.


O grupo responsável pelo levantamento de terras que poderiam ajudar a encontrar saídas juridicamente cabíveis, integrado pelo INCRA e governo do MS, simplesmente comunicou que não fez o levantamento pois não existem terras disponíveis no Estado.
 
Diante da manifesta falta de boa vontade do governo estadual, resta aos povos indígenas, suas comunidades e organizações encontrarem os melhores caminhos para terem seus direitos respeitados e as violências físicas,  culturais e psicológicas erradicadas.

"Foi muito frustrante. Cada vez que vou numa reunião dessas saio com dor de cabeça", desabafou um dos indígenas participantes.

 A dor em chamas

Enquanto isso o sofrimento, a violência e destruição continuam no chão manchado de sangue indígena, no Mato Grosso do Sul.

Mais uma vez a cacique Damiana e seu povo à beira da estrada, se veem envoltos  na dor da terra negada e agora novamente seus barracos queimados pela insana ganância da cana. A usina São Fernando arrenda as terras que envolvem o acampamento, para o plantio de cana. Mesmo as chamas não apagam a esperança da guerreira e sua gente, de um dia voltarem novamente parra seu tekohá-terra tradicional.

Esse provavelmente é o acampamento que mais tem sofrido em termos de mortes por atropelamento, queima de casas, expulsão por várias vezes nesses mais de quinze anos na beira da estrada.

O diretor da Survival Stephen Corry disse hoje, ‘Os povos indígenas do Brasil são constantemente sacrificados em nome da ganância, suas vidas perdidas na busca do crescimento econômico a qualquer custo humano. Os Guarani têm o direito de voltar às suas terras, mas em vez disso, são forçados a sofrer uma vida de imundície na beira da estrada.’(Cimi-27/08/13)




Egon Heck

Povo Guarani Grande Povo

Cimi Brasília 29 de agosto de 2013

 

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O Estado das "Mesas"


O Ministro da justiça manifestou a sua convicção de que agora o governo encontrou o caminho da roça, do diálogo. São as mesas. Amplas e irrestritas, na medida do possível. Mesas de negociação. E quando uma liderança Pataxó interveio dizendo "Direitos não se negocia. Cumpra-se a lei. O ministro teve que aliviar. "É, mas o direito no papel é uma coisa e na prática a realidade é outra"


Todos sabemos disso. Os povos indígenas nunca se negaram ao diálogo afinal isso é uma pratica milenar nas comunidades, mas sempre diálogos de soluções nuca diálogos de enrolações .

A PEC e as pegadas

Finalmente. Conforme prometido várias vezes, o governo começa a se manifestar publicamente contra a avalanche de  projetos de lei e emendas constitucionais que rondam no Congresso, tentando subtrair direitos indígenas da Constituição.

As afirmações do Ministro da Justiça revelam  "O governo é contra essa proposta(PEC 215). Juridicamente e no mérito. É inconstitucional e fere o princípio da separação dos poderes. Disse ao Henrique Eduardo Alves: sou contra, isso vai aumentar a pressão, vai transformar a demarcação em disputa política. Vocês estão errando. Estão radicalizando e jogando fogo. E perdendo a oportunidade de  resolver pacificamente. Se é que querem resolver pacificamente — disse Cardozo, que não garantiu a rejeição dessa PEC no Congresso" (O Globo, 22/08/2013).

Mais senhor ministro. O governo tem que ser contra a portaria 303 que é contra a Convenção 169, da OIT e a Constituição do país,  a PLP 227 que é inconstitucional e contra as normas internacionais (OIT,ONU...) E principalmente se posicionar contra a instalação da Comissão da PEC 215, anunciada pelo presidente da Câmara para dia 4 de setembro.

Essa semana o governo inaugurou mais uma mesa. A mesa da Dilma.Ou melhor, sugerida pela Presidente, por ocasião de seu primeiro encontro oficial com os povos indígenas, depois de dois anos e meio de governo. Será que o governo está mesmo disposto a descolonizar sua visão e prática  com relação aos povos indígenas? Será que o Estado brasileiro está disposto a fazer uma inflexão em sua política indigenista, tão marcada pelo preconceito e repressão, heranças da ditadura militar? ou será que esta ganhando tempo tentando agradar a todos até as eleições?

É tempo de despir-se da colonialidade, como em vários países da América latina está acontecendo! Reconhecer a plurinacionalidade dos países, colocar  o Bem Viver como escopo do Estado, reconhecer os direitos da Natureza, da Pacha Mama-Mãe Terra, é colocar-se no caminho do futuro e não o caminho do mercado e dos privilégios de minorias.

A mesa do Henrique Alves, presidente do Congresso já acabou. Quando os índios , em abril, adentraram no plenário da Câmara, provocaram uma situação de pânico e correria,  ganharam uma mesa, um espaço de diálogo, uma comissão de conversação. Umas poucas reuniões e a mesa acabou. Agora é só após outro episódio.

Outras mesas, comissões e fóruns estão encerrando suas atividades, sem  sinalização de vontade política das mudanças exigidas. A Comissão do Conselho Nacional de Justiça já entregou seu relatório ao presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa. Em 127. Em 127 páginas de informações, debates, fotos, mapas, listagens de terras indígenas no Mato Grosso do Sul, e sua situação na justiça e no executivo, é sem dúvida um início  que exige decisão e ação dos responsáveis pela regularização das terras indígenas e da solução dos conflitos e violências que marcam esse processo.

A comissão exorta a União  "a conclusão definitiva do processo administrativo demarcatório  com indenização das benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa fé." Sugere ainda saídas já anuncias à exaustão como " desapropriação de áreas por interesse social, aquisição direta de terras, o assentamento de pequenos proprietários rurais, a transação judicial e a indenização do produtor rural por ato ilícito do Estado decorrente da titulação considerada  posteriormente ilegítima". 

Dentre outras medidas faz um apelo "aos juízes de todo o país para a adoção de absoluta prioridade aos processos judiciais envolvendo a demarcação das terras indígenas".

A Comissão Especial Guarani, criada no âmbito da Secretaria de Direito Humanos, também deliberou pela visita da Ministra Maria do Rosário ao presidente do STF Joaquim Barbosa para solicitar urgência no julgamento das ações relacionadas aos direitos indígenas

Assembleia da COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira)

Está começando hoje, na aldeia Umutina, no município de Barra do Bugre-MT, a 10 Assembleia Geral da COIAB, num momento histórico da luta dos povos indígenas contra a supressão de seus direitos na Constituição. Em pauta, além das questões nacionais, a reestruturação da organização e eleição da nova coordenação. Enquanto organização aglutinadora dos povos e do movimento indígena na Amazônia, essa articulação das lutas em nível regional e nacional é fundamental. Daí a importância dessa Assembleia.

 

Egon Heck

Povos da Amazônia, Povos guerreiros

Cimi Brasília, 26 de agosto de 2013

 

sábado, 17 de agosto de 2013

Porque correm tanto, senhores Ministros!


 

Tem centenas de filhos de hansenianos me esperando. Eles também merecem atenção. Preciso ir.Tem uma delegação de ruralistas me esperando. Eles querem conversar. Precisamos dialogar com todos. Preciso ir, pois tem um grupo de trabalho que está buscando aperfeiçoar o processo de demarcação das terras indígenas. Preciso estar lá. Tem agricultores do Paraná que querem conversar sobre a demarcação de terras indígenas. Preciso ir. Cheguei um pouco tarde, estava em outra agenda, mas vim aqui  pois não poderia deixar de estar com vocês. A palavra de ordem é dialogar, evitar conflitos, superar tensões, nada de desgastes . " E na nada de soluções!"

Mas ministros, vamos ao menos tirar uma foto juntos, insistiram alguns indígenas! Concordaram, mas cada um saiu correndo para um canto. Como por encanto, sumiram.

O que a delegação de 16 povos indígenas sentiram, na audiência no Palácio do Planalto, com os quatro  Ministros - da Justiça, Casa Civil, AGU e Secretaria Geral da Presidência da República, é que os Ministros tem pressa. Tem que dar o recado, mostrar que existe unidade no pensamento e ação do governo, deixar claro que o governo não está contra os índios, mostrar os grandes feitos, deixar todos satisfeitos, aparentemente e sumir.  As palavras de ordem dos ministros é negociar, dialogar, evitar judicialização e conflitos, governar para todos.
O ministro da Justiça afirmou que agora parece ter sido encontrado o caminho da solução, a mesa de negociação. Já está implantada no Mato Grosso do Sul. Logo mais será instalada no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. E se dirigindo diretamente aos caciques dos 16 povos indagou: porque não seguir o mesmo caminho na Bahia? Vocês topam? Se quiserem ligo imediatamente para o governador Jaques Wagner e marcamos logo o encontro para instalar a Mesa de Negociação na Bahia. Os indígenas surpresos com a apressada proposta do governo, não se manifestaram a respeito. Iriam consultar os demais participantes e as comunidades. Porém como o ministro da justiça não mostrou nenhuma vontade de assinar as portarias das terras indígenas da Bahia, que estão em sua mesa, numa avaliação posterior, REPUDIARAM a criação dessa mesa de diálogo. "Direito não se negocia. Se houver boa vontade e boa fé por parte do governo, cumpra seu dever constitucional, assine as portarias, e depois sentaremos `a mesa para dialogar".

A Ministra Gleisi Hofmman se esmerou em  afirmar  que não é verdade que o governo é contra os índios, ou que existam posições contraditórias dentro do próprio governo sobre os direitos indígenas. "Temos que ouvir todas as partes, somos governo de todos! Será?

Resultados, decepções e indignação.

Semana da Bahia nativa em Brasília. Os 150 indígenas de 16 povos que vieram da região do início da invasão, cobrar seus direitos e manifestar sua indignação com a conduta do Estado brasileiro com relação a seus direitos,  deixaram Brasília, essa madrugada, cansados , mas com a certeza do recado dado. Foi uma semana intensiva de informação e formação política, no coração do poder. Fizeram muito toré, invocaram os encantados, os seres de luz, Tupã, na esperança de arrancar algumas posições favoráveis  às suas inumeráveis reivindicações de direitos. Participaram e falaram em duas audiências publicas, tiveram encontros em vários ministérios e órgãos,  fizeram várias manifestações nas praças e dentro dos espaços das atividades.

Entregaram cartas, documentos, fizeram falas duras, deram voz à indignação e revolta. "A invasão que começou em nossa região há mais de 500 anos, continua hoje. Porque o governo não cumpre a lei que fizeram?, indagaram várias vezes diante dos presidentes da Funai, do Incra, do ICMBio, da Sesai, da secretaria Geral da presidência da República.




Muitas desculpas e promessas esfarrapadas ,  tergiversações, e afirmações desalmadas.  Diante das pressões e cobranças, parece que o governo se entrincheirou no vazio da negociação,  no diálogo para evitar o conflito,  no ganhar tempo e evitar desgaste num aberto jogo de interesses eleitorais.

Os  melhores resultados ficaram por conta de uma semana de visibilização da causa e luta dos povos indígenas, no Brasil, e de forma especial, na Bahia, onde a invasão começou. Tupã ,os encantados e os iluminados  minoraram os sofrimentos de horas e horas em um transito caótico, ou transitando nos espaços do poder.

Homenagem, solidariedade e saudade

Irmã  Lucinda Moretti (71) , que trabalhava com as comunidades indígenas Kaiowá Guarani, nos deixou repentinamente  dia 16, quando sofreu um grave acidente com o carro em que retornavam para a cidade de Juti. Lutadora incansável, marcava também presença solidária junto a acampamentos dos sem terra.  Nossa solidariedade aos seus familiares à Congregação das Irmãs de São José, ao Cimi MS e aos familiares e amigos de nossa inesquecível guerreira Ir. Lucinda.

Nosso apoio solidário também aos tupinambá da Bahia que nesses dias retornaram a vários espaços tradicionais, de seu território, estando a sofrer pressões e ameaças.

Egon Heck e Laila Menezes

Povo Guarani Grande Povo e povos da Bahia, os primeiros invadidos,

Cimi Brasília, 17 de agosto de 2013

domingo, 11 de agosto de 2013

Kaiowá Guarani -Manchas de Vergonha


 

A Anistia Internacional vem acompanhando com preocupação a realidade dos povos indígenas no Brasil e particularmente no Mato Grosso do Sul. Foi no intuito de ver e sentir a atual situação desses povos que uma delegação coordenada por Salil Shetty. Estiveram no acampamento da Teko'á wirixa (Xamã) Damiana, próximo a Dourados, na beira da BR 463. 

Uma "mancha de vergonha", conforme expressou o representante da Anistia. Ali onde a cana e a soja se encontram, onde casebres Kaiowá Guarani estão espremidos entre a cerca e o asfalto, talvez seja a mais contundente imagem da discriminação,   racismo e genocídio em curso contra comunidades desse povo.

A alta velocidade com que os veículos passam no local, sem nenhuma sinalização, fazendo frequentes vítimas, manchando de sangue asfalto e terra, é mais um trágico símbolo da violência estrutural ali implantada. Somente neste acampamento ocorrem a morte de 5 pessoas da mesma família, por atropelamento.

A delegação acompanhada de várias lideranças indígenas da região e aliados, foi também, em silenciosa indignação, prestar sua homenagem às vítimas, especialmente crianças, mortas nos últimos anos, sem que até hoje nada tenha sido feito para punir responsáveis ou evitar a continuidade da tragédia. As cruzes na beira de um riacho, num resto de mata, tem que ser colocadas e visitadas à escondida, pois os donos do agronegócio na região querem impedir a todo custo o sepultamento das vítimas neste  local. E narra a Xamã Damiana que viu o corpo de sua tia, ser arrancado por uma escavadeira a mando dos mesmo.

Não é apenas mais uma delegação a constatar a violência, contra os direitos humanos e étnicos de uma comunidade Kaiowá Guarani, é mais um grito de alerta internacional contra as "manchas de vergonha" espalhadas  pelo Mato Grosso do Sul.

Dia Mundial dos Povos Indígenas

Por ocasião do dia mundial dos povos indígenas instituído pela ONU em dezembro de 1994, houve inúmeras manifestações, denúncias e protestos pelo mundo afora.

A Coordenação Andina dos Povos Indígenas  (CAOI) divulgou uma carta na qual chamam atenção dos Estados nacionais e sociedade sobre o continuado desrespeito dos direitos dos povos indígenas, apesar de serem signatários de várias leis, normas e convenções que garantem o direito desses povos especialmente a seus território e recursos naturais, liberdade e paz.

Concluem se pronunciando "contra a perseguição judicial e todas as demais formas de criminalização do movimento indígena de Abya Yala como estratégia de intimidação aos líderes indígenas  e contra a liberdade de expressão e direito de protestar que os povos originários temos tido como única estratégia de visibilizarão de nossos direitos".

 Em Roraima em torno de 500 indígenas marcharam pelas ruas da capital Boa Vista,

protestando contra a violação de seus direitos, entregando documento em várias repartições públicas. No documento denunciam as diversas ações em curso  contra os direitos indígenas nos três poderes. Concluem conclamando "O  Estado de Roraima deve aprender e trabalhar com a realidade local e adequar o plano de desenvolvimento a partir dos direitos indígenas. Com nossa Marcha no dia  Internacional dos Povos Indígenas, chamamos atenção das nossas autoridades públicas para a grave situação dos direitos dos povos indígenas em Roraima para reverter esse quadro negativo, pela Justiça e Dignidade."

Mesa de diálogo ou de enrolação

Frustração. Esse foi novamente o sentimento entre os mais de 40 mil Kaiowa e Guarani no Mato Grosso do Sul. O governo, através de seus ministros havia prometido uma solução definitiva para a grave situação das terras indígenas desse povo e dos Terena. A reunião  que deveria definir a proposta foi protelada do dia 5 para o dia 7, sem qualquer proposta concreta de solução, além de uma saída de duvidosa execução, para a Terra Indígena Buriti, onde foi assassinado pela polícia a liderança Terena Oziel.

Os Kaiowá Guarani honraram sua palavra e não retornaram a nenhum território tradicional, originário, neste período. Já o governo, através da "mesa de diálogo" apenas gerou mais uma profunda decepção e total descrédito quanto às soluções infinitamente adiadas.

Com nosso grande profeta e poeta D. Pedro nos colocamos na sintonia da esperarnça e tranformação

Oração da causa indígena

Pai-Mãe da Terra e da Vida,
Deus Tupã de nossos pais e mães,
Venerado nas selvas e nos rios,
No silêncio da lua e no grito do sol:

Pelos altares e pelas vidas destruídas

Em teu nome, profanado,

Nesta nossa Abia Yala colonizada,

Te pedimos que fortaleças

A luta e a esperança dos povos indígenas

Na reconquista de suas terras,

Na vivência da prória cultura,

Na fruição da autonomia livre.

E dá-nos (a nós neocolonizaores)

Vergonha na cara e o amor no coração

Para respeitarmaos esses povos-raiz

E para comungar com eles em plural Eucaristia

Awere, Amém, Aleluia

(Dom Pedro Casaldáliga)

Pelos altares e pelas vidas destruídas
Em teu nome, profanado,
Nesta nossa Abia Yala colonizada,
Te pedimos que fortaleças
A luta e a esperança dos povos indígenas
Na reconquista de suas terras,
Na vivência da própria cultura,
Na fruição da autonomia livre.
E dá-nos (a nós, neocolonizadores)
Vergonha na cara e amor no coração
Para respeitarmos esses povos-raiz
E para comungar com eles em plural Eucaristia.
Awere, Amém, Aleluia!







                        Egon Heck

                        Povo Guarani Grande Povo

                        Cimi, Brasília, 11 de agosto de 2013