ATL 2017
segunda-feira, 15 de abril de 2019
Índios do Maranhão em Brasília
Queremos nossa terra e nossos direitos
Nesta Semana Foram representantes do povo Apanjekra da Terra Indígena Porquinhos localizada nos município de Fernando Falcão. Também integraram a delegação indígenas do povo Memortumre Canela da aldeia Escalvado, município Fernando Falcão, Maranhão.
As principais demandas tem sido a regularização de seu territórios.
A Terra Indígena de Porquinhos obteve portaria declaratória em 2009 assinado pelo Ministro da Justiça Taso . Portaria essa posteriormente anulada.
“No entanto, deixamos claro, que nosso povo não vai parar de lutar por nosso território. Nosso sangue foi derramado naquele chão, que para nós é sagrado, pelo f. estamos disposto dar a nossa vida por nosso território de nossos avós terem vivido livres em nosso território, se preciso for. Não temos medo de morrer para garantir o Bem Viver para o nosso povo e nossa futura geração.” (em documento entregue nos gabinetes dos Ministros do Supremo Tribunal Federal)
No final do documento fazem um dramático apelo aos Ministros do STF “portanto Senhores e Senhoras Ministros ouçam a voz do vosso coração, sintam o calor da mãe terra penetrando em seu corpo através de vossos pés. Deixem ser tocados pela mãe natureza que clama para ser preservada”.
As lideranças do povo Memurtum re denunciaram a construção de uma estrada que atravessa seu território causando muitas violências, conflitos e mortes r doenças. Além disso a estrada está propiciando desastres e crimes ambientais. No documento de denúncia elencam ainda a retirada de minérios. Acusam com responsável pela construção da estradas o prefeito Adailtom do município de Fernando Falcão. Entre outros crimes destacam a violação dos direitos dos povos e comunidades indígenas que não foram consultados sobre a construção da estrada, causado genocídio indígena além da morte de dois indígenas José Caipar Canela e Jairo Cohruw Canela.
Auditórios blindados e aldeias abertas
Os indígenas conseguiram ultrapassara primeira barreira, mas encontraram um Congresso com portas dos auditórios intransponíveis, sendo obrigatório uma senha para ter acesso aos espaços onde os indígenas queriam participar. Uma inovação, uma espécie de blindagem da democracia. No corredor, em frente das portas dos auditórios restou aos índio sentarem no chão dos corredores. Será que eles tem medo de nos?
Uma das lideranças achou muito estranho não poderem entrar, ficando de pé ou sentados no corredor. “Na aldeia não acontece isso não. Nós recebemos bem todos os que vem a nossas casas e aldeias. E perguntou: será que eles tem alguma coisa que querem esconder?
Muitos indígenas era a primeira vez que saíram da aldeia para cidade grande. Tiveram medo em enfrentar as esteiras rolantes e elevadores.
Saudade da Constituinte – 30 anos depois
Acompanhei um grupo que foi visitar os gabinetes dos deputados. Em geral os indígenas foram recebidos com muita simpatia e promessas de apoiar os projetos alguns gabinetes abriram seu pequeno espaço para receber toda a delegação, tirar fotos e manifestações de respeito e carinho.
Porém não se poderia imaginar que depois de três décadas A Carta Magna se encontrasse tão desrespeitadas e sob forte pressão de retrocesso e descumprimento Os direitos indígenas em grande parte, mormente com relação à demarcação e garantia dos territórios, ainda não foi cumprida. Sequer o Estatuto dos Povos Indígenas foi aprovado, contribuindo para a situação caótica e avanço de setores anti-indígenas.
Valeu. A luta continua. Na avaliação durante essa semana em terra estranha viram e ouviram muitas coisas. Agora podem lutar melhor porque conhecem quem são seus amigos e seus inimigos Quem quer tomar as terras. Olhamos nos olhos deles. Eles não podem mais dizer que nós não existimos
Agora não temos mais medo. Fomos massacrados, mas agora estamos conhecendo, até o governo é contra nós.
Egon Heck
Cimi Secretariado
Brasilia, 12 de abril de 2019
quarta-feira, 10 de abril de 2019
Governo Bolsonaro: cem dias contra os povos indígenas
Mais um lamentável recorde do atual governo Bolsonaro, na definição cruel de uma política indigenista do atual governo. Desde o primeiro dia de governo cumpriu o que havia prometido aos ruralistas e a outros interesses anti-indígenas “Não irei demarcar um centímetro de terra para os índios”. E para que essa promessa inconstitucional se tornasse realidade, seriam necessárias criar as condições objetivas para que se transformasse numa política de governo e não apenas uma promessa de um candidato em campanha. Daí a razão da Medida Provisória 870, com a qual o que restava da Funai foi esquartejada em vários ministérios e setores anti-indígenas. Foi um golpe mortal. Ou melhor pretendia abrir o caminho para o que as ditaduras militares e civis não conseguiram nesses cinco séculos: exterminar os povos indígenas. No início da ditadura militar, em 1964, os índios eram estimados em tono de cem mil sobreviventes, em menos de cinco milhões de hectares. Mas hoje são em torno de um milhão.
Nenhum governo dos últimos 50 anos foi tão contumaz e afoito
contra os índios, em seus primeiros 100 dias de governo. Se de um lado, Bolsonaro
foi tão longe em suas ações e promessas anti-indígenas, de outro, os inimigos
dos povos indígenas parecem ter entendido tais ações como sinal verde para
cometer todo tipo de violências, especialmente a invasão de terras indígenas já
demarcadas para implantação de loteamentos e exploração madeireira. Com o total
esfacelamento da Funai, está aberto o caminho para o pretendido extermínio.
Outra afirmação, inúmeras veze repetida pelos governos ditatoriais
militares, é a de que os índios não são objetos de museu, mas querem ser como
os demais brasileiros. Essa é a expressão na qual está embutido o desejo de um
Brasil sem índios. Ou seja, os índios seriam “emancipados”, via decreto
presidencial. Com isso, seus territórios seriam liberados para exploração do
agronegócio, agricultura e pecuária especialmente. Esse foi o grande projeto do
ministro do Interior, General Rangel Reis, em 1975. Os povos indígenas pareciam
ter enterrado a proposta de Rangel Reis e seus aliados. Porém, mais de 40 amos
depois, a proposta de “integrar” os índios à sociedade volta a ser proposta,
dessa vez dentro dos 100 dias do governo Bolsonaro.
Ameaças permanentes de retrocesso
Antes mesmo de esquentar a cadeira de presidente, assinou,
ainda no primeiro dia de seu mandato, a Medida Provisória 870, na qual atingiu
o coração da política indigenista do Estado brasileiro. Estraçalhou a já
moribunda Funai. Pedaços do órgão foram parar no colo dos ruralistas, como a
responsabilidade pela regularização das terras indígenas. No campo da saúde, o
governo Bolsonaro não tardou em propor a extinção da Secretaria Especial de Saúde
Indígena, entregando o atendimento às prefeituras, e destruindo o modelo conquistado
a duras penas através de inúmeros encontros e debates desde a aldeia até os
seis encontros nacionais, através do subsistema da saúde indígena, assumidos
nas seis conferências nacionais.
O mesmo processo acontece com relação à educação escolar
indígena. Os professores indígenas, juntamente com suas comunidades, estão
construindo com muita luta e determinação, um caminho de descolonização do
sistema escolar implantado pelo projeto colonial. O agora ex-ministro, Vélez
Rodriguez, demitido esta semana, vinha destruindo as bases que a duras penas
foram sendo construídas pelos povos indígenas nas últimas décadas.
Permanente mobilização e luta do
movimento indígena
Quando se conversa com os povos indígenas sobre os êxitos no
enfrentamento com as forças e interesses que buscam exterminá-los, a resposta
se reporta sempre aos aprendizados de cinco séculos de resistência. E essa
resistência tem sido alcançada graças à profunda espiritualidade e a sua
relação harmoniosa com a natureza.
O movimento indígena emergido na década de 197, teve como
fundamentais e fundantes os processos das Assembleias Indígenas regionais e
nacionais, iniciadas em abril de 1974. Em seguida, sustentaram o enfrentamento ao
projeto de “emancipação”, que visava disponibilizar as terras indígenas ao
capital expansivo do latifúndio. No bojo dessas lutas, o movimento indígena
teve o surgimento de um importante movimento de apoio à causa indígena. Até
hoje, várias dessas entidades continuam como adiados dessas causas, dentre elas
o Cimi, o CTI, a CPI.
Outro momento fundamental das lutas do movimento indígena,
foi o processo Constituinte. Dele se estaca o enfrentamento da mineração ávida
para se expandir sobre os territórios indígenas. Um fato relevante desse
período foi a tentativa de impedir a aprovação dos direitos indígenas na
Constituição. Foi então criada a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito,
quando toda a trama mentirosa das mineradoras foi derrubada. Logo em seguida,
em outubro de 1988, foram aprovados os direitos dos povos indígenas na nova
Constituição. Apesar da intensa mobilização para conseguirem essa conquista, a
luta continua até hoje. O Estatuto dos Povos Indígenas ainda não foi aprovado e
está em curso um movimento nos três poderes no sentido e modificar e excluir
direitos indígenas. Outro marco importante foi a Marcha e Conferência Indígena,
Negra e Popular, realizada por ocasião das “comemorações dos 500 anos” do
início da invasão dos territórios indígenas. Já no século 21 destacamos, a
importante participação dos povos indígenas na Brasil nos três fóruns sociais
mundiais, realizados em Porto Alegre, RS (2001, 2002 e 2003). Na sequencia, em
2004 se iniciou a realização dos Acampamentos Terra Livre, que são até agora os
espaços políticos de denúncia e unificação de lutas dos povos indígenas.
Desde 2005, o movimento indígena continua levando adiante
suas lutas através de suas próprias iniciativas, em nível dos povos e regiões,
articulados em termos nacionais pela APIB (Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil).
As mobilizações são permanentes, para evitar qualquer
retrocesso e exigir que sejam cumpridas a Constituição e a legislação
internacional, relativas aos povos originários no mundo.
O mês de abril, é um dos momentos fortes de tomada de
consciência da importância dos povos indígenas para toda a sociedade, de socialização
e denúncia das violências a que continuam submetidos esses povos, bem como os
povos tradicionais. É o momento de ampliar as alianças e avançar na luta.
Apesar da atual política indigenista sinalizar para o recrudescimento
dos conflitos e violências, o movimento indígena tem acumulado bastante
sabedoria para vencer estas novas batalhas.
Egon Heck
Fotos – Laila-Cimi
Brasília, abril 2019.
quarta-feira, 3 de abril de 2019
Sobrevivência humana depende das comunidades indígenas
Os líderes religiosos (nhanderu e nhandeci) veem com muita
preocupação e apreensão o momento que estamos vivendo, o perigoso caminhar da
humanidade. Na visão desses líderes, os indícios são de que o mundo vai acabar.
Enquanto um grupo de lideranças dos povos de Mato Grosso do
Sul (Kaiowá Guarani, Terena e Kinikinau), participava de audiência no
Ministério Público Federal, o Nhanderu Olimpio, sua esposa e mais um rezador,
faziam seus rituais, pedindo proteção e forças para que os líderes dos povos
originários sejam iluminados e sábios na luta dos direitos de seus povos. Com o
semblante preocupado, prenunciou: “O mundo vai acabar. Os nhanderu que
sustentam o mundo estão acabando”. E prosseguiu em suas preocupações quanto ao
destino do mundo: “Os jovens estão perdendo a cultura”. Apesar dessa trágica
ameaça que pesa sobre o desequilíbrio em que a terra está ameaçada em cair,
apesar de tudo isso, “estamos, nós índios em luta por nossa terra”. “O nosso Pai
do céu deu a terra para os índios. Por isso estamos lutando por nossa terra”. Lembrou
ainda da abundância que tinham em suas terras, com muita mata, água boa, muita
comida. “E agora acabou tudo. Tudo acabado. Mato não tem mais. Onde tem mato
tem chuva”.
Coincidência ou não, um estudo recente que envolveu
pesquisadores de 15 países, mostra que as práticas dessas comunidades com o
manejo dos polinizadores são fundamentais para o meio ambiente e para o
bem-estar do homem em nosso planeta (ver mais).
Espaço de resistência e violência
A visita à Comissão de Direitos Humanos, da Câmara dos
Deputados, foi um dos momentos fortes. O presidente da Comissão, deputado Helder
Salomão, foi muito receptivo ouvindo atentamente as denúncias da situação de
barbárie contra os povos indígenas. Frisou que nesse momento inicial, sua
gestão ouvirá a sociedade e seus clamores, visando fazer o enfrentamento às
violências da melhor forma possível. Informou que mesmo antes de ser indicado
para presidir a comissão, visitou os índios Tupiniquim e Guarani, localizados
no Espírito Santo. “Vivemos tempos sombrios. Esta comissão será um espaço de
resistência, de luta pelos direitos dos povos indígenas”.
Eliseu Guarani-Kaiowá expressou com veemência as violências
a que estão submetidos no Mato Grosso do Sul. “Hoje estou aqui denunciando as ameaças
que nós lideranças estamos sofrendo. Estando hoje aqui e amanhã não estarmos
mais junto do nosso povo”. Para que o presidente e toda a Comissão de Direitos
Humanos tenham uma noção mais realista do que está se passando com os povos
indígenas no Mato Grosso do Sul, insistiram que fizessem uma visita à região.
Paulinho Terena afirmou que as lideranças de seu povo estão
sendo massacradas: “Elas precisam de segurança urgente. Somos contra o
arrendamento de nossas terras, contra a municipalização da saúde indígena.
Queremos a Sesai fortalecida”.
Outra liderança Kaiowá Guarani, denunciou um descaso
gravíssimo sofrido por uma indígena num hospital da região: “Somos maltratados
e perseguidos. E nossa alma fica presa quando somos perseguidos. O genocídio
dos povos originários continua. Mas não estamos amedrontados”.
Por fim, outras lideranças que se manifestaram na audiência
na CDH pediram o fortalecimento da Funai para que esta possa cumprir a sua
obrigação que é “demarcar nossas terras”. Ao invés de esquartejar a Funai, como
fez o presidente da República no primeiro dia de seu mandato.
Depois de mais uma semana de presença em Brasília, permanece
a firme decisão para que não haja retrocesso e perda de direitos. Retornaram a
suas aldeias depois de muita mobilização, reza e luta. Partiram com a firme convicção
de que os povos indígenas do Brasil vão avançar sem medo na luta por seus
direitos.
Egon Heck
fotos\lailaCimi
Secretariado nacional do Cimi
Brasília, início de abril 2019.
quinta-feira, 28 de março de 2019
A beleza da vitória e a vitória da beleza e da diversidade
No Superior Tribunal de Justiça, a delegação indígena Pataxó
foi recepcionada de maneira honrosa e respeitosa. Nenhuma restrição à maneira
tradicional de suas vestimentas ou qualquer coisa do gênero. Foram
recepcionados com dignidade na diversidade de suas maneiras de ser e viver.
Viram e ouviram com atenção, as decisões sobre a ação em
julgamento. Momento gratificante para os guerreiros e lideranças que estavam
neste recinto, ouvirem os oito juízes proferirem seus votos favoráveis aos
direitos indígenas da terra indígena Pataxó, de Barra Velha-Monte Pascal, na
região de Porto Seguro, Bahia.
De alma lavada e direito territorial conquistado, a
delegação partilhou com sua gente, nas aldeias e seus aliados Brasil e mundo
afora, que, apesar de tudo, são possíveis a conquista por direitos e mudanças
profundas em nosso país. A vitória foi dos povos indígenas do Brasil. Um pouco
de oxigênio em meio a cenários tão sombrios.
Direitos humanos: a difícil luta dos
povos originários, oprimidos e empobrecidos do nosso país
No dia de ontem, mais um momento forte da luta pelos
direitos dos povos indígenas no Brasil. Uma esperançosa união na luta pela
vida, pela justiça e pela paz. A nova gestão da Comissão dos Direitos Humanos
da Câmara dos Deputados, confirmou ser um espaço de resistência e de luta para
evitar retrocessos e avançar na consolidação dos direitos humanos, étnicos e
ambientais.
Dezenas de parlamentares e inúmeras organizações e entidades,
manifestaram seu integral apoio e colaboração com a Comissão de Direitos
Humanos.
Sonia Guajajara, em nome da Articulação dos Povos Indígenas
do Brasil (APIB), denunciou as inúmeras iniciativas que estão sendo implantadas
visando extinguir direitos e acelerar o genocídio contra os povos indígenas.
O presidente da Comissão, deputado Helder Salomão, insistiu
na importância dos membros da comissão de ouvir a sociedade, e os clamores das
vítimas da violência e do ódio que está sendo apregoado pelo atual governo.
Várias entidades e deputados, denunciaram veemente o anúncio
da comemoração
do dia 31 de março, dia do golpe da ditadura militar. Isso
representa uma apologia da tortura, da violência, o ódio e o retrocesso.
Hoje a delegação de mais de 100 indígenas está retornando
para suas aldeias no sul da Bahia. A luta continua, pois só a mobilização desde
as aldeias e comunidades poderá frear as tentativas de retrocesso de
desconstrução de direitos. Outras delegações virão e darão continuidade às
lutas contra a municipalização da saúde indígena, contra o esquartejamento da
Funai e a entrega da demarcação das terras indígenas aos inimigos dos povos
originários.
Egon Heck – fotos Laila/Cimi
Secretariado Nacional do Cimi
Brasília, 29 de março de 2019
domingo, 24 de março de 2019
Mais um guerreiro na casa do Pai
Thomaz partiu silencioso em sua derradeira “missão calada”. Foi
mais de meio século de doação de uma vida a uma causa. Desde aquela Semana
Santa de 1967, de maneira especial com seu companheiro Egydio, acenderam a
chama de um novo indigenismo missionário, marcado por um compromisso radical e
coerente com a causa dos povos indígenas, com respeito à vida, cultura,
religião e autodeterminação desses povos.
Encarnação
Desde os primeiros contatos com os Kaingang e Guarani do Rio
Grande do Sul, na década de 1960, foi construindo, em meio a dores e alegrias,
dúvidas e certezas, um novo caminho missionário que veio a se concretizar na
criação do Cimi – Conselho Indigenista Missionário, do qual participou de
diversas formas, desde Conselheiro até vice-presidente e articulador da questão
das terras indígenas. Também foi designado pela Missão Anchieta como diretor do
internato de Utiarit, em Mato Grosso. Um processo lento, de dores e esperança,
de coragem profética, de ousadia e fé.
Caminhos plurais e causa
comum
A Missão Anchieta, na Prelazia de Diamantino, foi uma terra
fértil para a afirmação de um novo indigenismo missionário de resistência e
conquista de importantes direitos dos povos indígenas.
Aí também temos a fundamental contribuição de Thomaz. Sua
sensibilidade aguçada, coragem e determinação, ele e Egydio tiveram a intuição
de ajudar os povos indígenas no Brasil de darem um passo decisivo na luta e
conquista de seus direitos, especialmente suas terras. Ao sentirem os povos originários
em nosso continente se unirem e mobilizarem para enfrentar a opressão do
sistema colonial, procuraram buscar um caminho solidariedade, apoio e
visibilidade às lutas dos povos indígenas em nosso país.
Da aldeia ao Sínodo
da Amazônia
Thomaz tornou-se semente de resistência, de novos caminhos
possíveis e necessários em nosso ardor missionário e testemunho profético. Tua
presença e partilha de vida com os Myky, é certamente um desses caminhos a
emergir com vigor no Sínodo da Amazônia que se realizará em outubro desse ano.
Thomaz! Pagaste um preço alto pela tua ousadia e
radicalidade, mas podes ter a certeza de que o sofrimento se transformará em
semente e a semente em muitos frutos.
Abraço a meu melhor
amigo, companheiro de luta e caminho
No dia em que encontramos Vicente Kiwxi, você Jaúka, aos
prantos, bradaste por justiça: “Encontramos esse meu maior amigo... Chorei
comovido, e, pensando na figura desse meu amigo, que tombava ali, insepulto até
então, ignorado por todos, como ele foi durante muito tempo, por muita gente,
que não dava valor ao tipo de trabalho que ele levava, que era de total
respeito ao povo Enawenê Nawê” (Provocar rupturas, construir o reino, memória,
martírio e missão de Vicente Cañas, Egon Heck e Paulo Suess, ed. Loyola, 2017).
Como afirmaste há poucos dias, por ocasião dos 50 anos da
OPAN, teu batismo de fogo foi ajudar a sobrevivência dos Tapaiúna, que foram
quase totalmente massacrados pela irresponsabilidade do Estado brasileiro, e
que até hoje estão sem ter sua terra devolvida.
Thomaz, os povos indígenas são imensamente gratos, pois
foste e continuas sendo um guerreiro dessa causa, agora junto a todos os que
deram suas vidas por essa causa.
Egon Heck
Secretariado Nacional do Cimi
Brasília, início de outono de 2019.
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019
OPAN: meio século na luta pelos direitos indígenas
Dia de muito calor em Cuiabá, Mato Grosso. Dia especial.
Momento de comemorar o meio século de existência da Operação Anchieta,
posteriormente Operação Amazônia Nativa (desde 1987). Além de ser a primeira entidade criada dentro
do processo de surgimento de um novo indigenismo, no final da década de 1960
ela teve a mesma raiz e inspiração do Cimi, que seria criado quatro anos
depois, por Egydio e Tomas, ambos jesuítas ligados à Missão Anchieta, em
Diamantino, MT.
Momento histórico. Os idealizadores da entidade expuseram o
contexto eclesial e social em que ousaram enfrentar conjunturas adversas para
abrir um novo caminho de compromisso missionário, a partir de um novo e radical
compromisso com os povos indígenas e as populações marginalizadas e oprimidas.
Essa rebelião que partiu do coração de cada um dos fundadores
da OPAN, estava em sintonia e alimentada pela fé transformadora e necessidade
de mudanças profundas. Como sentiam e vivenciavam essa realidade de dentro das
estruturas, percebiam a necessidade de partir para outros caminhos, que não das
missões tradicionais com estruturas de internatos. Os leigos seriam os que
neste momento poderiam fazer a diferença, pois não tinham sobre si o peso das
estruturas. Estariam mais leves e livres para um compromisso mais radical com
os povos indígenas que estavam submetidos a um intenso processo de extermínio.
No dia 6 de fevereiro, a OPAN inicia a comemoração dos 50
anos de existência com a presença dos idealizadores e fundadores Egydio e Tomás
e alguns dos primeiros voluntários que estavam atuando em projetos no norte do
Mato Grosso e na Prelazia de Guajará-Mirim, em Rondônia.
Os fundadores da entidade expuseram os caminhos que os
levaram a idealizar a entidade a partir da força e insatisfação presentes na
juventude, submetida ao regime ditatorial militar e de uma Igreja que estava
sendo impulsionada pelos ventos do Concílio Vaticano II, além de outros
momentos fortes em nível de América Latina.
Tomas Lisboa expôs a histórica caminhada que resultou no
desmonte a missão de Utiariti e o consequente deslocamento dos missionários
para as aldeias. Também relatou seu batismo de fogo ao conviver por alguns
meses com os Tapaiuna (beiços de pau), vítimas de mais uma ação criminosa do
governo, que articulou o contato com esse povo, desencadeando a drástica
redução de mais de 300 índios para uns 40 sobreviventes. E estes foram
transferidos para o Parque do Xingu, onde aguardam até hoje seu retorno ao território
original.
Egydio Schwade contou as peripécias enfrentadas ao procurar,
em vários lugares do Brasil, voluntários que assumissem o desafio radical de
conviver com os povos indígenas nas aldeias, num processo de encarnação, desde
o aprender a língua do povo, até procurar ao máximo ser um deles. Foi nos
seminários que ele obteve maior adesão à sua proposta. Lembrou que a OPAN no
decorrer desse meio século de existência teve muitas mudanças e enfrentou
muitos desafios. Porém, foi sem dúvida uma caminhada com muita dignidade e
compromisso com os povos indígenas em nosso país.
OPAN e Cimi, uma
mesma raiz e caminhos diversos
Houve uma sintonia e articulação muito intensa entre as duas
entidades. Tanto isso é verdade que em determinados momentos, membros da OPAN passaram
a trabalhar no Cimi e membros do Cimi eram também membros da OPAN. O primeiro
secretário geral do Cimi foi Egydio que na ocasião era coordenador da OPAN. Nos
dez primeiros anos, os missionários do Cimi faziam o curso de formação
indigenista na OPAN.
O importante de toda essa história é que a causa indígena
ganhou aliados de compromisso e confiança na luta por seus direitos e no
enfrentamento das lutas contra seus inimigos.
Indígenas dão seu
recado
A primeira mesa foi de representantes dos povos indígenas. Estes
insistiram na importância de não apenas festejar, mas de aprofundar a aliança e
solidariedade entre os povos originários para enfrentar com sabedoria, união e
energia todas as adversidades que o atual governo pretende desencadear contra seus
direitos.
As lideranças indígenas foram unânimes na avaliação da
gravidade da situação com relação aos direitos dos povos indígenas. Esta
situação exige uma permanente vigilância e mobilização para que não prevaleça o
império da violência, da criminalização e retrocesso com relação aos direitos
conquistados. Igualmente importante foi considerada a formação de quadros, de
guerreiros, que façam o enfrentamento contra as forças adversas encasteladas no
atual governo, com um discurso anti-indígena orquestrado pelo atual presidente.
Uma história de lutas e conquistas, solidariedade e alianças
com os povos originários do Brasil. Na
abertura do evento Ivar, um dos históricos membros da entidade, fez referência
às inúmeras ações que foram desenvolvidos nesses 50 anos. pela vida e direitos
dos povos indígenas
Como Opanista e em seguida como membro do Cimi pude
testemunhar e partilhar de inúmeras lutas, vitórias e derrotas dos povos
indígenas em nosso país e outras regiões do continente americano
Egon Heck
Cimi Secretariado
Nacional
quarta-feira, 19 de setembro de 2018
Os Kaiowá Guarani e as rezas sobre os nomes dos inimigos
O Brasil e o mundo estarão unidos aos Nhanderu e Nhandesi
Kaiowá Guarani na luta pela vida e pela terra de Guyraroka e demais territórios
indígenas ainda por demarcar.
A enorme força espiritual dos Kaiowá Guarani se manifesta de
várias maneiras, desde as rezas fortes dos Nhanderu, para que o sol se apague
até as rezas que lhes permite penetrar no coração das pessoas para demovê-las
de ações que atinjam ou neguem os seus direitos de viver em seus tekoha,
territórios tradicional, originários, com paz os seus projetos de Bem Viver.
Os mais de 50 Kaiowá e Guarani que estiveram em Brasília
para lutar pelos seus direitos, fizeram um dos rituais de reza sobre o nome de
várias pessoas, especialmente as que estão fazendo e aprovando leis que vão
contra a Constituição do país, no que diz respeito aos direitos dos Povos Indígenas.
Simultaneamente uma tarefa da Polícia Federal agia no Mato
Grosso do Sul. Prenderam o filho do governador Reinaldo Azambuja, PSDB, e o
deputado Zé Teixeira, DEM, que reivindica como sua a terra do tekoha Guyraroka.
Foram fazer companhia ao ex-governador André Pucinelli, que já está preso. Ele
tem insistentemente se manifestado contra o direito dos índios a seus
territórios. Dentre afirmações por ele feitas, uma diz que “é um crime dar um
palmo de terra aos índios que não produzem”. Nessa mesma direção foram recentes
declarações de Bolsonaro, que se eleito for, não demarcará um centímetro de
terra para os índios.
Enquanto isso, os povos originários da região continuarão
fazendo seus rituais e rezas, até que seus direitos seja garantidos.
Os Kaiowá Guarani continuarão rezando sobre os nomes de seus
inimigos, na esperança de que terão suas terras reconhecidas e garantidas. Esse
é um direito originário reconhecido na Constituição e legislação internacional
da qual o Brasil é signatário.
Quem sabe, a recuperação de altas somas de recursos
desviados possa ser canalizada para demarcar e garantir os territórios
indígenas no Mato Grosso do Sul.
Durante a semana em Brasília, os indígenas também foram para
a Advocacia-Geral da União (AGU), para entregar à Ministra documento pedindo
imediata revogação do parecer 001, também, conhecido como parecer do genocídio.
Na quinta-feira, a delegação Kaiowá Guarani que esteve a
semana em Brasília acabava de embarcar rumo às suas terras, retomadas e
acampamentos. Alegria contagiante. Estavam leves, alegres, sorridentes. As
vitorias e debates com vários setores da sociedade e do governo alimentaram os
frágeis mas profundos e consistentes fios de esperança. Foi a expressão
concreta do pacto que assumiram na recente Aty Guasu realizada na Terra
Indígena Guyraroka. “Nosso povo já rezou junto e fizemos um pacto. Todos os
Tekoha estão conectados e estarão juntos para defender com nossos corpos e
nosso sangue os territórios que forem afetados pelo Marco Temporal, Parecer 001
da AGU ou outra ferramenta genocida contra nossos povos” (Carta da Aty Guasu de
Guyraroka 24-08-2018).
Chegaram à capital federal ansiosos, pois além das lutas
concretas de suas comunidades sentiam o peso da responsabilidade de darem
continuidade às lutas dos povos
indígenas do Brasil, tendo como objetivo principal a não aprovação do Marco
temporal, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A presença mais importante foi com os Ministros do STF,
através de conversas e entrega de documentos nos gabinetes, solicitando a
reversão da anulação da Terra Indígena Guyraroka e a participação dos índios
nesse processo e em todos aqueles que tratam da questão indígena, conforme reza
a Constituição. Fizeram muitos rituais antes e depois da retirada da plenária
virtual do STF.
Estiveram também na Funai, Ministério da Saúde, Ministério
da Educação (MEC) e Procuradoria Geral da República.
O Brasil e o mundo estarão unidos aos Nhanderu e Nhandesi
Kaiowá Guarani na luta pela vida e pela terra de Guyraroka e demais territórios
indígenas ainda por demarcar e garantir para os povos originários deste país e
de América Abya Yala.
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